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LGBT | É urgente um plano de luta para enfrentar a violência LGBTfobica e o transfeminicidio

O início de 2017 já está marcado pela contínua violência, assédios e assassinatos por razão de ódio aos LGBT e aos que desafiam a ordem de gênero e da sexualidade heteronormativa. Essa realidade, apesar de ofuscada pelos políticos da ordem e transmitida pela mídia por suas lentes vitimistas-impotentes, é de um crescimento ímpar combinado ao avanço da direita em importantes cargos, não apenas no Brasil, mas no mundo, com ênfase na vitória do reacionário Donald Trump, nos Estados Unidos.

Virgínia GuitzelTravesti, trabalhadora da educação e estudante da UFABC

Maíra MachadoProfessora da rede estadual em Santo André, diretora da APEOESP pela oposição e militante do MRT

segunda-feira 16 de janeiro de 2017 | Edição do dia

Em Santo André, Paulo Serra do PSDB foi eleito com 80% dos votos válidos, e, apesar da alta abstenção, surfou no movimento anti-PT gerado em meio ao golpe institucional que visava a aplicar os ajustes fiscais mais rapidamente. Para a população LGBT, este golpe significou ver inimigos abertamente odiosos de nossas identidades e sexualidades tendo mais espaço nas mídias e sentindo-se mais encorajados a proliferar suas ideologias sexistas, machistas e LGBTfóbicas. Com poucos dias de mandato, o prefeito já anunciou o fim da Secretaria de Mulheres e de Direitos Humanos, um posicionamento claro de que não temos nada a esperar desta prefeitura para enfrentar a violência e a discriminação LGBTfóbica.

Mas se olharmos para o longo legado deixado pelo PT, tanto no município de Santo André, quanto na região do ABC, ou mesmo durante seus 12 anos na presidência do país, veremos a tamanha covardia que este partido teve para levar a frente as bandeiras mais elementares da população LGBT, tendo sido em muitos casos um verdadeiro obstáculo para a garantia desses direitos, a relembrar o veto da ex-presidente Dilma Rousseff ao Kit-AntiHomofobia, proposto pelo MEC para se debater a igualdade nas escolas, ou a “Carta Ao povo de Deus”, de Lula, que garantia a isenção de impostos às igrejas, ou os conchavos políticos que levaram Carlos Grana a se aliar ao PSC de Marcos Feliciano para as eleições municipais do ano passado.

As vidas LGBT importam

O Brasil, reconhecido internacionalmente como o país que mais assassina pessoas trans no mundo, compartilha com os demais países da América Latina a triste perspectiva de vida de apenas 35 anos para a população trans. Os inúmeros casos que seguem até hoje sem justiça e punições, como o de Verônica Bolina ou Laura Vermont, dão apenas um rosto a uma longa cadeia de violência, de ausência de direitos sociais e de precarização da vida e das condições de sobreviver. As pessoas trans, em grande parte, expulsas de casa quando assumem para si e para o mundo sua identidade de gênero, perdem o direito à educação, a mesma educação que segrega e discrimina; é negado também o direito ao trabalho formal, seja pela discriminação na contratação, pela ausência do nome social ou ainda pela não conclusão do ensino fundamental ou médio. Por fim, a população trans encontra, na maioria dos casos, sua única oportunidade de sobrevivência dentro da prostituição, onde estão 90% das pessoas trans.

Dentro da prostituição, das esquinas escuras e das casas de cafetinagem lotadas, a precarização da vida é combinada com uma violência das cafetinas e da polícia, insistentemente. São ilusões de meninas que saem do norte do país para vir a São Paulo para "conseguir corpo", são promessas e ilusões da possibilidade de emancipação que são pagas cotidianamente com a submissão à profunda miséria sexual imposta pelo Estado e pelas instituições que garantem a permanência da população trans num gueto próprio, baseado no lucro de poucos sobre a sexualidade "exótica" que podemos oferecer à quem pague.

Para as mulheres lésbicas, sua sexualidade é anulada pela medicina capitalista que não reconhece seu corpo capaz de se relacionar com outra mulher. E são punidas pela sociedade patriarcal, machista e lesbofóbica, com o estupro corretivo e outras medidas aterrorizantes para controlar e normatizar seus corpos. São os homens gays que não são reconhecidos como homens e cotidianamente convivem com o perigo de virarem mais um número na estatística de que a cada 26 horas, um LGBT é assassinado no Brasil.

Organizar a luta em defesa das LGBT, sem perder nossa bandeira pela liberação sexual de toda a humanidade

A luta LGBT não se trata apenas de direitos sociais, vem de uma trajetória dos movimentos pela liberação sexual que nos deixou uma lição fundamental: tamanha repressão sexual que rege nossa sociedade à serviço da superexploração do trabalho e da garantia de poucos proprietários e empresários controlarem o mundo não pode se dissolver rumo à igualdade social de LGBT, heterossexuais e pessoas cisgêneras. Que mesmo a igualdade perante a lei, que estamos na linha de frente para arrancar, ainda não significará igualdade perante a vida e o fim das opressões. Isto é, para que as vidas LGBT importem, é necessário uma luta séria e revolucionária contra o capitalismo e a lógica que faz o lucro acima das vidas humanas.

Nós que construímos o Esquerda Diário e a Faísca - Anticapitalista e Revolucionária estamos atuando ao lado de muitos ativistas e grupos LGBT que reivindicam a criação de um Conselho LGBT em Santo André para exigir políticas públicas que atendam as nossas necessidades. Porém, ao passo que acompanhamos o movimento LGBT e as lutas que legitimamente ele trava para garantir melhorias em suas condições de vida, seguimos denunciando os políticos da ordem, a Igreja e o Estado como responsáveis pelos nossos mortos. Dizemos claramente que não acreditamos que um Conselho consultivo e atrelado ao mesmo Estado que produz a LGBTfobia possa levar a uma transformação social que possibilite o combate à desigualdade e à repressão sexual.

Propomos um Plano de Emergência de Combate à LGBTfobia e ao transfeminicídio que contraponha os nossos interesses da libertação sexual e do desenvolvimento humano aos que lucram com nossa repressão e perpetuam esta cadeia de opressões para melhor dominar e dividir a classe trabalhadora. É por essa bandeira que nos colocamos na linha de frente contra cada ataque, assédio, agressão ou assassinato, que nos fazem vítimas por nossas sexualidades e identidades subversivas. Mas não compartilhamos a ideia da mídia ou de diversos grupos que somos apenas vítimas. Somos a prova viva de que somos mais do que vítimas, somos uma poderosa força para colocar este sistema de exploração e opressão abaixo e por isso insistimos na nossa organização para superar esta sociedade. Chamamos a todos a participar da Intervenção Artística Contando Corpos e demais iniciativas que denunciem a violência contra as LGBT e a retirada de nossos direitos, batalhando para que nosso movimento possa recuperar a tradição de StoneWall e se organizar de maneira combativa e independente para se enfrentar com este sistema e seus gestores. Queremos construir uma perspectiva de se aliar à classe trabalhadora e se enfrentar com o inimigo em comum: a classe capitalista. E impor o nosso desejo de um novo mundo!




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