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CAMPOS DE CONCENTRAÇÃO E ESTIGMA DE "DOENTES" CONTRA GAYS | Documentário “Parágrafo 175” resgata a barbárie da perseguição nazista aos homossexuais

quarta-feira 20 de setembro de 2017 | Edição do dia

Foto: gays prisioneiros dos campos são levados portando nos uniformes o triângulo rosa invertido que os nazistas usavam para identificá-los.

O documentário "Parágrafo 175", do ano 2000, resgata uma história pouco contada da Alemanha nazista: sua brutal perseguição aos homossexuais e as torturas contra eles nos campos de concentração.

No período que antecedeu o ascenso nazista, a Alemanha vivia um período de grandes convulsões sociais. Levantes revolucionários incríveis ocorreram nos anos de 1919, 1921 e 1923, e os trabalhadores alemães mostraram grande disposição de luta e a possibilidade concreta de tomar o poder, o que só não se efetivou pela imaturidade do Partido Comunista no início, após a traição histórica do Partido Social Democrata Alemão, que havia abandonado a perspectiva revolucionária e apoiado a burguesia alemã na guerra. Depois pela política de vacilações e erros que dominou sua direção nos levantes revolucionários posteriores.

Por fim, a criminosa política do Partido Comunista Alemão já dominado pelo stalinismo, que igualou os social-democratas aos nazistas e se negou a constituir uma frente única operária para enfrentar o partido de Hitler, foi determinante para a derrota dos trabalhadores.

Contudo, o período de grandes convulsões sociais que ocorreu na Alemanha entre o fim da primeira guerra e a queda do império em 1919, e a ascensão de Hitler em 1933, que ficou conhecido como "República de Weimar", é de uma riqueza cultural, científica e de diversas outros âmbitos que pouco se viu em outros momentos. Esse momento é retratado em "Parágrafo 175" e mostra como havia um imenso salto na liberdade sexual da época, com os homossexuais sendo a vanguarda dessa grande transformação.

O título do filme refere-se ao parágrafo que criminalizava a homossexualidade no código penal alemão de 1871, e contra o qual se organizou um grande movimento, liderado pelo sexólogo Magnus Hirschfield (socialista e homossexual) pelo fim da criminalização aos homossexuais. Havia um grandioso precedente: logo ao lado, na Rússia revolucionária governada pelos sovietes o novo código penal havia sido o primeiro do mundo a descriminalizar a homossexualidade. A luta na Alemanha era promissora, e caminhava lado a lado com o combate dos trabalhadores contra o capitalismo e a dominação burguesa na no país.

"Parágrafo 175" mostra como o nazismo foi responsável pela retomada de uma aguda criminalização dos homossexuais, mas como a oposição liberal a Hitler contribuiu à sua maneira. Ernst Röhm, braço direito de Hitler e organizador de suas tropas paramilitares da SA, era homossexual, fato que era conhecido por todos. Por um lado, isso criou a ilusão nos homossexuais que eles não seriam perseguidos, pois havia um membro importante do governo que era gay. Por outro lado, opositores tentaram utilizar esse fato para desmoralizar Röhm, e o filme mostra como, nesse momento, sem poder abrir mão dessa figura de grande importância, Hitler o defendeu e tratou sua homossexualidade como um "mal menor", e afirmou:

"A SA não é uma instituição para a educação de jovens e gentis damas, mas sim uma formação de combatentes experientes. (...) A vida privada não deve ser objeto de investigação a não ser que entre em conflito com os princípios básicos da ideologia nazista."

A verdade é que era uma declaração baseada na conveniência, pois desde sempre os nazista perseguiram e condenaram a homossexualidade. Não demorou muito para que Hitler mandasse executar Röhm, utilizando sua homossexualidade como um dos pretextos para o seu assassinato. Ele prometeu "limpar o partido nazista de homossexuais".

Logo que tomaram o poder, os nazistas destruíram o Instituto Para Ciências Sexuais de Magnus Hirschfield foi destruído, e toda sua biblioteca incendiada, como se vê nas fotos de grandes fogueiras de livros nazistas - em sua maioria são fotos da destruição desse instituto. Os nazistas chamavam os intelectuais judeus, comunistas, homossexuais, entre outros de "degenerados". Termo que ficou familiar a nós após as perseguições no Brasil à exposição Queermuseu ou à exposição "Cadafalso", e à peça teatral "O evangelho segundo Jesus Rainha do Céu".

A Gestapo (polícia política nazista) criou um departamento especial para perseguir o "crime" de homossexualidade. Himmler, comandante da SS, afirmou que cerca de 7 a 8% dos homens na Alemanha eram homossexuais, e que se as coisas permanecessem assim "nossa nação será arruinada por essa praga. Aqueles que praticam a homossexualidade privam a Alemanha dos filhos que devem a ela".

Em 1935, os nazistas rediscutiram o parágrafo 175 para ampliar o que consideravam comportamento homossexual e, portanto, criminoso. Aqui, uma discussão que surgiu entre eles parece tristemente atual: debatendo se incluiriam as lésbicas junto com os homens - até então os únicos enquadrados pela lei como criminosos - os nazistas decidiram "poupar" as mulheres da definição de criminosas, pois consideraram que o lesbianismo era uma condição temporária e "curável". Eles também entendiam os homens gays como "doentes", e com um mal "contagioso", mas o "tratamento" para eles eram os campos de concentração.

Sim, eles queriam aplicar "terapias de reorientação sexual", tal como se quer fazer hoje no Brasil às lésbicas. Ironicamente, a maior defensora dessa ideia, Rozângela Justino, comparou a militância LGBT ao nazismo, quando de fato há muitos aspectos de sua própria ideologia que lembram a forma como os nazistas agiram em relação aos homossexuais.

Para as mulheres, eles criaram a "Liga de Combate ao Aborto e à Homossexualidade" (mais uma semelhança, que em nada tem de coincidência, com os setores evangélicos brasileiros que querem criminalizar o aborto mesmo em caso de estupro).

Nos campos de concentração, os homens gays sofreram torturas monstruosas, muitos morreram, outros carregaram sequelas para o resto de suas vidas. Essa é uma história de criminalização e patologização dos gays. Não pode ser esquecida jamais, e não podemos permitir nunca que ela se repita.

Assista o documentário "Parágrafo 175":

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