×

ABORTO | Descriminalização do aborto: uma discussão feita por quem, para quem no Senado Federal?

sábado 9 de maio de 2015 | 00:01

A Comissão de Direitos Humanos do Senado realizou no dia 05 de maio, uma audiência pública sobre: "Instruir a SUG nº 15, de 2014, que regula a interrupção voluntária da gravidez, dentro das doze primeiras semanas de gestação, pelo Sistema Único de Saúde”. A audiência teve início às 9h da manhã e terminou já era quase 14h. Foi dividida em dois momentos, duas mesas compostas por: o representante do Conselho Federal de Medicina, Henrique Batista e Silva; uma representante do Movimento Católicas pelo direito de decidir, Rosângela Aparecida Talib; representante do CEBES, Ana Costa do Conselho Nacional de Saúde, Socorro Souza da OAB-DF, Ilka Teodoro; a Médica neonatologista, Eliane Oliveira; a integrante do movimento Brasil sem Aborto Elizabeth Kipman; a especialista em Saúde Coletiva e Bioética, Isabela Mantovani; e o ex-procurador geral da república e atual teologista Cláudio Fonteles.

Nas primeiras falas, da médica Elizabeth Kipman e da especialista em saúde coletiva Isabela Mantovani, o aborto foi colocado não como uma questão de saúde pública, ou como realidade. O envolvimento da Anistia na questão foi questionado, os riscos físicos e psicológicos das mulheres estavam no centro da discussão para ambas e a todo o momento, os (poucos) dados, estimativas que temos sobre o assunto foram colocados como duvidosos. A palavra “irresponsabilidade” foi o fio condutor da discussão, confesso que as falas de ambas foram tão exaustivas que pensei em me retirar da audiência, porém resisti na esperança de presenciar um debate que trouxesse questões reais sobre o aborto: que ele existe! Que mulheres negras e pobres morrem todos os dias em abortos clandestinos.

Em seguida, houveram falas no mesmo sentido, carregadas de disputas religiosas, de machismo, porém a senadora Regina Sousa (PT-PI) trouxe o recorte de raça e classe para discussão e também a questão de que a culpabilidade do aborto recai apenas em cima das mulheres. “Só a mulher é criminalizada. E o homem?”. O homem que ao não assumir a paternidade, ao abandonar a companheira, comete um aborto, porém, não é criminalizado. A mesma falou que ricas e pobres; brancas e negras abortam, entretanto, as mulheres pobres correm mais riscos de vidas. Ao chegarem ao Hospital Público não recebem um atendimento humanizado, muito pelo contrário, são julgadas e mal atendidas quando internadas para curetagem pós-abortamento. Porém, apesar do argumento da senadora combater uma visão conservadora do tema, essa fala é contraditória, pois ao mesmo tempo o partido do qual a senadora faz parte, o PT, controla qualquer possibilidade de organização de uma campanha pelo direito ao aborto, para manter as alianças e nesses doze anos do governo petista foi rifado este direito.

Maria do Socorro Souza, do Conselho Nacional de Saúde pautou o que mais estava me incomodando, a questão da representatividade. “O ideal seria se as mulheres que praticam o aborto estivessem aqui. Não temos espaços democráticos para essas mulheres. O sentimento de culpa recai sobre elas. Não cabe a nós nos colocarmos no lugar delas. Sobre quais mulheres estamos falando aqui?”.
Vale ressaltar que, num espaço que tem como foco de discussão a descriminalização do aborto, a autonomia da mulher, a bancada foi composta majoritariamente por homens e dos 27 senadores eleitos, responsáveis pela votação, apenas 5 senadores são mulheres, o que corresponde a 18,5% do total. Na audiência apenas uma senadora estava presente. O Parlamento é um espaço masculino, burguês, branco, e pautar questões relacionadas às mulheres significa travar uma batalha na qual a maioria das mulheres não se sentem representadas, primeiro porque o debate não chega até elas, segundo porque quase não há mulheres nesse espaço para representá-las.

Questões como o capital estrangeiro na saúde pública, a dificuldade de acessar dados referentes ao número de abortos no Sistema Único de Saúde, a falta de atenção dada às mulheres vítimas de violência sexual, a falta de humanização e qualificação dos profissionais da área da saúde a respeito dos casos de interrupção de gravidez não foram pautados e quando tais assuntos foram tocados, não houve interesse em discuti-los.

Por fim, acredito que sem participação popular o debate não avança, pois a questão do aborto está mal posta, não há um esforço do parlamento em avançar com qualidade na discussão, muito menos de se posicionar perante o assunto. Enquanto isso, mulheres morrem diariamente em abortos clandestinos...




Comentários

Deixar Comentário


Destacados del día

Últimas noticias