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ELITIZAÇÃO DA USP | Com notas mínimas de até 700 nas vagas pelo ENEM, USP reafirma seu elitismo

Exigindo notas mínimas altas nas vagas oferecidas pelo SISU, que toma como base o ENEM, alguns cursos sequer tiveram todas as vagas disponíveis preenchidas. Mais uma prova do elitismo da Universidade de São Paulo, que se nega a promover políticas reais de democratização do acesso.

Flávia ToledoSão Paulo

sábado 16 de janeiro de 2016 | 00:00

Para 2016, a Universidade de São Paulo utilizará, pela primeira vez, outra forma de ingresso além da FUVEST. Depois de uma forte luta no primeiro semestre de 2015 por cotas raciais na USP, o Conselho Universitário, evitando dialogar com os estudantes, anunciou a utilização do SISU, sistema que usa a nota do ENEM para o ingresso nas universidades.

Apesar de reivindicada pela reitoria como uma forma de ampliar e democratizar o acesso à universidade, o projeto se mostrou muito distante disso. O oferecimento das vagas pelo ENEM não se deu em todos os cursos, fazendo com que 10 das 42 unidades da universidade não participassem, como as tradicionalmente mais elitizadas Medicina e Escola Politécnica.

Das 1499 vagas disponíveis pelo SISU, 1169 serão destinadas a estudantes que realizaram seu ensino médio em escola pública, e apenas 123 dessas serão destinadas a negros e indígenas. Apenas 13 cursos terão a questão racial levada em consideração no ingresso. As 340 vagas restantes serão destinadas a ampla concorrência, ou seja, estudantes de escolas particulares que realizaram o ENEM poderão concorrer.

Notas mínimas altas não permitem o preenchimento das vagas

Mas, o projeto que se mostrou insuficiente desde o seu anúncio acabou se provando ainda mais elitista na última semana, quando ocorreram as inscrições. Com notas mínimas completamente exageradas cobradas pela instituição, havia menos inscritos do que vagas disponíveis. As vagas ociosas devem ser incorporadas pela seleção da FUVEST.

Diversos cursos exigem notas mínimas de 650 em alguma ou todas as habilidades, e cursos como os do Campus de Ribeirão Preto ou Medicina Veterinária e Zootecnia chegaram a exigir notas mínimas de 700 em todas as habilidades. Até então, nenhuma instituição tinha exigido notas mínimas superiores a 600 pelo SISU.

Devido às notas consideradas bastante exageradas, 19 cursos até a manhã de quinta-feira, último dia de inscrição, não tinham sequer nota de corte anunciada porque não havia candidatos suficientes para preencher todas as vagas. Sem alcançar a nota mínima exigida, os interessados não puderam se inscrever para concorrer às vagas. A situação ocorreu inclusive em cursos que apenas destinaram vagas para ampla concorrência, sem a política de cotas.

A exigência de notas tão altas por parte da universidade e a completa falta de comprometimento com uma real democratização do acesso apenas demonstram o quão elitista é a Universidade de São Paulo. A reitoria e a burocracia universitária quando impõem este modelo como uma “alternativa de ingresso” demonstram que seu interesse é que estudantes de escola pública não estejam na universidade e que negros e negras sigam entrando apenas para ocupar os postos mais precarizados de trabalho.

Este foi claramente um movimento para que apenas os estudantes mais elitizados da educação pública sigam entrando na USP, como estudantes de escolas técnicas, que têm “vestibulinhos” que selecionam os alunos. Sabemos o porquê dessa escolha. A universidade, hoje, coloca a produção do conhecimento a serviço dos empresários.

Fundações privadas interferindo na pesquisa, precarização de cursos menos mercadológicos, falta de professores, cortes de bolsas de pesquisa… Trata-se de um projeto de universidade que não responde às necessidades da população que trabalha e sustenta a universidade pública, mas não tem acesso a quase nada que ela oferece.

Impedir o acesso de estudantes de baixa renda é fundamental para que a reitoria possa atacar ainda mais a permanência estudantil. Não interessa à reitoria manter o estudante que necessita de permanência na universidade. Em um momento de crise orçamentária, é preciso ter de onde cortar, e há anos nós sabemos onde os cortes são feitos: na permanência, na graduação, no salário dos funcionários. Mas nenhum centavo a menos para os supersalários da burocracia universitária, nenhum centavo a menos para a corrupção das fundações.

É preciso quebrar os muros da universidade. Disputar o conhecimento produzido nela, os interesses a que ela serve, garantir condições dignas de trabalho e estudo. E, principalmente, realizar mudanças drásticas no acesso a ela. Não queremos uma falsa democratização do acesso com algumas vagas pelo ENEM que exigem 700 pontos como nota mínima, exigimos cotas racias já na universidade, que sejam proporcionais ao número de negros no estado! Que os estudantes pobres, oriundos da escola pública, tomem essa universidade e mudem o seu caráter!

Queremos isso pra já, mas sabemos que só há um jeito de definitivamente colocar os estudantes que estão fora da universidade dentro dela. Enquanto houver um filtro social que barre a entrada de alguém no ensino superior, sabemos que quem estará do lado de fora será negro, pobre, será uma mulher mãe, um lgbt que precisa se sujeitar a um trabalho absolutamente precário para poder pagar suas contas e sobreviver. É preciso lutar pelo fim do vestibular e pela estatização de todo o setor privado da educação, colocado sob controle daqueles que estudam e trabalham. Só assim teremos uma universidade pública, gratuita e de qualidade para todos, produzindo conhecimento para as necessidades da população e não para enriquecer alguns poucos.




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