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CRÔNICA | Com barulho de tiros acordo mais um dia, por Maria Eduarda e tantos outros uma luta

Carolina CacauProfessora da Rede Estadual no RJ e do Nossa Classe

sábado 1º de abril de 2017 | Edição do dia

Foto: Marcelo Theobald

Na quinta-feira acordei ao som de muitos tiros com a polícia invadindo o morro da Cachoeirinha no Lins. Mais uma vez a polícia interrompeu as aulas com mais um tiroteio no Complexo da Maré. Na escola municipal Vicente Mariano, em Bonsucesso, as aulas foram paralisadas. Deitar no chão e se esconder no corredor para evitar serem baleadas faz parte do cotidiano milhares de estudantes, professores e funcionários. Em Manguinhos aconteceu a mesma coisa de manhã.

No final do dia soube que Maria Eduarda, 13 anos, estava na aula de educação física dentro da escola e foi atingida por não só um mas três tiros de fuzil, na Pavuna durante uma operação policial. Sou professora e tenho vários alunos de 13 anos. Nos muros da mesma escola de Maria, 2 jovens deitados no chão são mortos a queima a roupa. As cenas são uma brutalidade impressionante. Não encontro palavras para descrever além de barbárie, a mais cruel barbárie.

Dormi pensando no sorriso da Maria Eduarda. Os policiais são do 41° Batalhão da Polícia Militar, conhecido por ser o batalhão mais assassino no Rio de Janeiro, o mesmo responsável pelo caso dos 5 meninos alvejados por 111 tiros.

Sexta de manhã jornalistas em pânico recriminavam os protestos dos moradores e reclamavam de forma banal sobre o trânsito causado pelos ônibus queimados na Fazenda Botafogo, Acari, Costas Barros. O Rio de Janeiro deveria estar ardendo por essas mortes. Não foram balas perdidas.

O governo que se diz falido e quer nos fazer pagar pela sua crise, que parcela salário de servidores, atrasa bolsa de estudantes, mantem a UERJ fechada por sucateamento, é o mesmo que gasta mais do orçamento com Segurança (R$ 7,6 bilhões) do que com a Saúde (R$ 6,6 bi), Educação (R$ 5,4 bi) e Ciência e Tecnologia (R$ 2,9 bi). Na mesma semana, 5 dos 7 conselheiros do TCE-RJ, responsáveis por fiscalizar as contas do Estado, são presos por envolvimento em escândalos de corrupção.

Mostra clara da podridão descarada do capitalismo, da corrupção dos políticos que atuam à serviço dos capitalistas, perpetuam a miséria e a desigualdade, numa tentativa brutal de retirar nossos direitos.

Mais corpos negros mortos produto da ação da polícia, extremamente violenta e assassina.

Só esse ano 182 pessoas foram mortas pela polícia no Rio. Isso nos números oficiais. E quem está mais interessado em entender como a vida da Maria Eduarda lhe foi tirada à força e punir os responsáveis? A investigação e o julgamento dos responsáveis não pode ficar nas mãos da polícia. Por uma investigação independente de seu assassinato, formado por uma comissão da Escola Municipal Daniel Piza, pelo sindicato de professores, organismo da classe trabalhadora, entidades de direitos humanos e sob supervisão dos familiares. Pelo Fim da impunidade! Julgamento civil, por juri popular, de todos crimes de policiais como parte da luta para acabar com essas forças assassinas, as polícias civis e militares.

Na aula, um luto. Todos os dias uma luta. Maria Eduarda podia ser minha aluna. Claudia, DG, Amarildo podiam ser meus vizinhos. Um grito entalado na garganta que precisa tomar as ruas: as vidas negras importam.




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