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SUS | Calote na saúde: Planos de saúde devem R$ 826 milhões ao SUS

quarta-feira 24 de agosto de 2016 | Edição do dia

Segundo dados levantados pela Folha desde 2001, a cobrança ocorre todas as vezes em que a agência, por meio de cruzamento de dados do Ministério da Saúde, verifica que um paciente foi atendido na rede pública para um serviço que poderia obter na rede suplementar –ou seja, dentro do que foi contratado com o seu plano de saúde.

Desde 2001, quando a Agência Nacional de Saúde (ANS) iniciou o monitoramento, até julho deste ano, foram cobrados R$ 2,1 bilhões de ressarcimento ao SUS por esses atendimentos. Na prática, 40% desse valor não foi pago nem parcelado para recebimento futuro, o equivalente a R$ 826 milhões (em valores nominais).

Das 1.551 operadoras de plano de saúde que receberam cobranças para ressarcir o SUS, cerca de 444 deram o “calote” não pagaram nada ou menos de 1%. Há outras 125 que pagaram ou parcelaram entre 1% e 9% e 210 que acertaram de 10% a 49% —ou seja, menos que a metade do valor.

Lideram o ranking de operadoras com maiores débitos sem pagamento Hapvida (R$ 40 milhões), Central Nacional Unimed (R$ 35 milhões) e Unimed BH (R$ 24 milhões).

Estes grupos de planos de saúde atribuem a falta de pagamento a uma discordância sobre quais procedimentos podem ser cobrados, quais deveriam ter sido feitos ou até mesmo em relação ao próprio processo de ressarcimento.

A cobrança deste ressarcimento está prevista na lei 9.656, de 1998, que trouxe regras para os planos de saúde. "É um instrumento de justiça contábil, criado para evitar que planos se sintam motivados a se desobrigar de coberturas e enviar seus pacientes ao SUS", afirma Mário Scheffer, professor da Faculdade de Medicina da USP, em entrevista à Folha.

Na prática, porém, as notificações de cobrança só começaram em 2001. Ainda assim, só para procedimentos mais simples —serviços de alta complexidade, como hemodiálises e quimioterapia, por exemplo, só foram incluídos nas análises em 2015. "Há um passivo imenso que não foi cobrado. E do pouco que é cobrado, muito não é quitado", diz Scheffer

Houve no último período um aumento da procura por servições no SUS, que está diretamente atrelada ao aumento do desemprego, que fez com que cerca de 1,5 milhão de pessoas migrassem dos planos de saúde para o SUS

Enquanto isso, o ministro da Saúde, Ricardo Barros, propõe duas saídas para esta situação, a primeira é que seja criado um “plano de saúde acessível” e com cobertura reduzida que visa incentivar as pessoas a irem para os hospitais particulares em detrimento do SUS, forma de aumentar diretamente o lucro dos empresários da saúde e tirar do estado a responsabilidade com a qualidade e investimento na saúde pública. A outra medida é de criar um mecanismo de pagamento automático do plano de saúde quando um paciente seu dá entrada no SUS. Está segunda medida, que segundo Barros quer apenas agilizar o processo de ressarcimento, na verdade permite ao hospital saber se aquele paciente possui plano de saúde para aquele atendimento ou não, informe diretamente ao plano de saúde e este decida se vai manter o paciente no SUS ou tranferi-lo para algum hospital conveniado, através de um contrato prévio com as operadoras. A ideia é definir quais procedimentos podem ser cobrados "automaticamente", e por qual valor, caso um usuário de plano busque a rede pública para atendimento.

Elza Fiúza/Agência Brasil
Ricardo Barros, ministro da Saúde
Ricardo Barros, ministro da Saúde
A iniciativa tem gerado preocupação entre especialistas e representantes de planos. Um dos impasses é que o processo de ressarcimento sairia das mãos da ANS para ser definido entre os planos e as unidades da rede.

Para Fátima Siliansky, especialista em economia política da saúde, isso pode gerar um conflito de interesses ao fazer hospitais terem que identificar se estão atendendo usuários de planos. "Qual a tendência? Se a tabela é melhor, é querer privilegiar a pessoa que tem plano porque vai trazer mais dinheiro", diz Fátima, que já foi diretora-adjunta da ANS.

Mesma preocupação tem Mário Scheffer, professor da USP e vice-presidente da Abrasco (Associação Brasileira de Saúde Coletiva), para quem a medida pode criar uma "dupla porta" em hospitais públicos –uma para pacientes com plano e outra para quem não tem. "Onde tem dupla porta, tem dois agendamentos. Isso vai criar dificuldade maior para quem só pode recorrer ao SUS, diz o professor, para quem a mudança pode dificultar a fiscalização dos pagamentos e trazer fraudes. "É um equívoco achar que dá para fazer no próprio hospital."

Outra crítica dos especialistas é o destino dos recursos, que ficaria concentrado em alguns hospitais e cidades com maior número de usuários de planos –hoje, todo o valor ressarcido vai para o Fundo Nacional de Saúde, que gere os recursos do SUS e pode reaplicá-lo em áreas mais carentes.

Vale lembrar que o ministro Ricardo Barros, conhecido por defender os interesses dos empresários da saúde, teve sua campanha patrocinada por uma das maiores agências de planos de saúde, o Grupo Aliança, que teve seu presidente, Elon Gomes, que está sendo investigado pela Polícia Federal na operação Acrômio, que no ano passado recolheu computadores, celulares e documentos bancários da residência do empresário.

Devemos reivindicar uma saúde 100% pública e de qualidade e não permitir que este serviço, essencial para as parcelas mais pobres da população, seja tratado como mercadoria pelo estado, de maneira a privilegiar os empresários, que lucram bilhões com a morte dos pobres. Por um projeto público anticapitalista de ampliação e modernização dos hospitais e contratação de trabalhadores da saúde.




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