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OPINIÃO | Caçando argumentos para defender o governo Dilma frente a sua crise (ou o momento Ricardo III de Dilma e do PT)

Já não são poucos os analistas ligados a blogsfera petista que já medem o Brasil “pós fim do governo Dilma”. As tropas oficialistas, sem general, posto que Lula não implementa nem a linha de conciliação com FHC (que se recusou) nem rompe com Dilma, e sem um plano de batalha que não vem nem da CUT, nem de Lula muito menos de Dilma, procuram explicações para seu Waterloo e ver o que poderão salvar, como chegarão em melhores (ou menos piores) condições para 2016 e 2018, com impeachment ou sem. Enquanto isso a direita vai agitando e preparando terreno para sua manifestação no dia 16 de agosto. Sem uma clara posição de esquerda contra o governo e contra a direita, os tucanos e outros setores da oposição de direita podem capitalizar o descontentamento com o governo e o PT.

Leandro LanfrediRio de Janeiro | @leandrolanfrdi

quinta-feira 30 de julho de 2015 | 01:14

Intermináveis especulações rondam o ambiente político nacional. O que fará o TCU? E Eduardo Cunha? Aécio? Haverá impeachment ou não? Que tamanho tomarão as manifestações de 16 de agosto que contarão com o chamado, pago em TV e rádio pelo PSDB? As expectativas antes insufladas por alguns blogueiros (ver por exemplo, O dia seguinte ao impeachment, de Nassif) que o impeachment seria possível mas desataria uma rebelião nos movimentos sociais, uma conflitividade social que nem Lula nem FHC poderiam andar nas ruas sem escoltas, um país à beira do golpe do Estado, não correspondiam ao estado de ânimo real.

As tropas governistas estão em crise, sem general, sem programa, e à caça de argumentos para justificar como ainda defendem o governo Dilma. Contra o perigo da direita não cabe aos trabalhadores embandeirarem-se de uma defesa de uma “democracia”. Uma democracia de Cunha, Feliciano, com seus desaparecidos como Amarildo, dos privilégios dos políticos, dos ajustes, da terceirização, e um largo etc. Mas é justamente contra a “direita e pela democracia” que está sendo chamado um ato no dia 20 de agosto por MTST e CTB, entre outros. Porém, o que faz falta é lutar tanto contra a direita, mas também contra o governo, construindo uma terceira força.

O combate que não pode ser feito pelo petismo

Este cenário de crise violenta nas ruas, não parece, até o momento, factível. Porque para ele acontecer é preciso que o lado derrotado (ou desafiado) entre em luta, e que o faça em escala maior e sem contenções do que fizeram Zelaya em Honduras ou Lugo no Paraguai. Ânimo histórico que nunca foi do petismo, de Lula, e parece cada vez menos o ânimo dos burocratas amainados por décadas de poder nos sindicatos somadas a décadas administrando o Estado capitalista em nível federal, estadual e municipal, e seus intermináveis cargos comissionados, fundos de pensão e outras benesses do capital.

Mesmo com tanta intriga voando nos jornais e no parlamento, a apatia parece instalada nas fileiras cutistas. Não é pra menos. De corrupção, a medidas que atacam os trabalhadores e salvam os empresários (PPE), MPs, cortes na saúde e educação, a até privatização de boa parte da Petrobras há um estoque sem fim de “maldades”.

Se do caminho dos “movimentos sociais petistas” não há até o momento mostra de vigor na crise política nacional, nem por isto os caminhos para o impeachment parecem simples.

Como que um TCU, com seu presidente arrolado na Lava Jato pela via de seu filho como lobista, poderá dar a cartada moral para o processo no Congresso? Um Congresso presidido por Cunha, também denunciado, terá o cacife? Alckmin, Serra, outros graduados tucanos que não tem interesse em eleições agora aceitariam? O PMDB se deixaria acertar junto? Por fim, o STF bancaria o impeachment?

Todas estas interrogações encontrarão respostas nas próximas semanas ou meses. Mesmo sem uma resposta petista, que já não pode vir com o vigor minimamente compatível com o desafio que a oposição burguesa lhe coloca, a crise política seguirá se desenvolvendo e pode abrir espaço para a entrada em cena das grandes massas, em especial da classe trabalhadora.

Sem a pressão dos “de baixo” a crise pode se desenvolver com impeachment ou sem, e aos ritmos dos trâmites judiciários, atacando mais e mais elementos do regime, colocando mais partidos na baila, aumentando a desconfiança nas instituições e hiato entre “representantes” e “representados”. Aquele sintoma de junho de 2013 ainda está no ar, tome ele as ruas ou não. O pico de greves em décadas que foi visto em 2013 e 2014 não sumiu. Há descontentamento com o PT em cada local de trabalho. Com ou sem impeachment este é o Brasil real.

A burocracia sindical, até a poderosa burocracia de Lula, Marinho e Vicentinho, nos metalúrgicos do ABC paulista não só não consegue mais eleger prefeitos e ganhar eleições no antigo bastião, como nas próprias fábricas históricas do ciclo do ascenso operário não consegue mandar como antes. Na VW tentou fazer os peões engolissem demissões, não conseguiram. Na Mercedes o PPE, e mesmo com plebiscito perderam.

Os de cima sem bater o martelo

Em meio a toda esta crise o imperialismo assiste quieto, nenhum pronunciamento de Obama, de Merkel, do FMI (fora uma pressão sobre o Congresso e Cunha e via agências de avaliação de risco, chamando ele a “ser responsável com os ajustes”). Com um bando ou outro, seus negócios estão se fortalecendo. No estratégico filão do petróleo temos Serra tentando abrir o pré-sal e Dilma vendendo 30% dos ativos da Petrobras. Visto de lá da Casa Branca o jogo brasileiro parece um “ganha, ganha”.

Odebrecht, Camargo Correa, etc, não se pronunciam sobre o que querem: estão presos. A FIESP está em modo “mudo”. Os reis da soja quietos detrás de sua presidenta, a ministra Kátia Abreu agora amiga de Dilma (seria ela uma amiga como Cunha ex-líder do PMDB representando o governo no primeiro mandato Dilma?). A FENABAN já dividida em 2014, com o Itaú com Marina e o Bradesco com Dilma, também está calada. Sem estes pesos pesados brasileiros ou estrangeiros batendo o martelo, o desenlace também não vem, se reforça ainda mais o ritmo palaciano-judiciário-parlamento da política nacional. Estes gigantes empresariais observam a crise mas também podem se contentar que os juros vão subindo (e com isso seus lucros), créditos agrícolas vão explodindo em subsídios, direitos trabalhistas retirados e algo de business as usual.

O que há de certo na política nacional é mais crise e mais enfraquecimento do governo. No mínimo isto, ou cenários com mais crise e conflitos.

Todos veem isto. Em diálogo desesperado, os últimos defensores do petismo nos locais de trabalho argumentam que “a queda do governo seria a abertura de uma situação ainda pior”. Não se sabe. As ações das massas que determinam isto. E hoje tanto objetivamente frente às privatizações, ataques e desgaste do governo tanto objetivamente como subjetivamente qualquer ação de massas progressista tem que atacar não só a direita mas também o petismo. É para este problema que devemos voltar nossa atenção, diálogo e ações.

Mal menor e independência política

Os tucanos, o PMDB “ajustariam muito mais”, dizem. É possível. Mas algo já é possível afirmar: não há hegemonia tucana ou neoliberal possível hoje. Vitória eleitoral é possível, impeachment também, mas não houve um “anti-junho” que fosse tão grande que fizesse o país rebobinar sua história de consciência nas massas até um longínquo 1998 em meio a ofensiva ideológica ianque, voltar um mundo que já não existe.

É possível tamanho retrocesso? Claro que é. Mas não da noite para o dia e sem imensos conflitos da luta de classes. O problema a nos enfrentarmos é qual força social colocaremos na rua contra esta perspectiva e contra um governo profundamente antioperário, antipopular e antinacional. Tanto o governo petista como os tucanos têm a oferecer ajustes, privatizações, corrupção. Esta é a certeza.

O país está pronto para uma terceira saída. Ou a esquerda a oferece ou algum aventureiro, algum trânsfuga das hostes da ordem petista ou tucana o fará. O PT e o governo estão em claro declínio e crise, porém ele e seus aliados ainda tem força para tentar paralisar as críticas contra si mesmo como se fossem “fazer o jogo da direita”. Para isto o PT ainda conta com aliados como MST e às vezes o MTST, para fins como este que Lula articulou uma frente “Grupo Brasil”. A falácia de defesa deste governo contra a direita ganha força quando setores de esquerda procuram criticar o governo. Defender os interesses dos trabalhadores só pode ser contra este governo, por isto o PSTU foi tão atacado pelo petismo nos últimos dias. Sua argumentação de “derrubada do governo” pelos trabalhadores, por fora da existência desta força só podia ser interpretado como apoiando a derrubada realmente existente hoje, a da direita, por mais que este partido busque se explicar depois. É preciso sair do mundo da propaganda e fazer uma terceira força ganhe os locais de trabalho e às ruas.

Faz falta à esquerda um pólo na luta de classes que seja anticapitalista, ou seja que defenda os trabalhadores contra os dois bandos capitalistas em disputa, os ajustadores petistas e os sempre neoliberais tucanos e outros setores de direita. Um pólo como este poderia organizar sindicatos classistas e combativos, oposições sindicais, movimentos estudantis e sociais que organizasse ações concretas de resistência aos ataques do governo Dilma e contra a oposição de direita, que avançasse a questionamentos mais profundos tanto do regime político nacional, começando a discussão da necessidade de uma assembleia constituinte livre e soberana que pudesse discutir como garantir cada demanda social que está na boca dos trabalhadores, de saúde, educação, moradia, emprego, renda.

Este pólo poderia partir da luta contra o desemprego e as demissões para defender a estatização das empresas que demitem, abertura do caixa das empresas, entre outras medidas. Um claro pólo político anticapitalista da esquerda antigovernista que organizasse assembleias nos locais de trabalho, paralisações, piquetes. Este exemplo concreto, e não só de panfletos e internet, faria dele uma força para pressionar a CUT e outras centrais a romperem com governo e colocarem sua força contra os ajustes de Dilma e ameaças da direita, e aí sim teríamos um “terceiro ator”. A realidade o chama a existir. Falta saber se ele poderá surgir.

Das fileiras governistas já soa o som da retirada. Uma nova esquerda pode e precisa emergir, uma esquerda que faça um balanço do PT e seus governos, e abra espaço ao classismo e perspectivas revolucionárias.

O momento "Ricardo III" do petismo e a necessidade de uma saída à esquerda

Vivemos um momento “Ricardo III” no petismo e por consequência no que a maioria da população brasileira sempre entendeu como esquerda. Esta personagem de Shakespeare em determinado momento de desespero clama “um cavalo, um cavalo, meu reino por um cavalo”. Ao contrário do que se imagina, o cavalo não é para fugir, mas para a personagem real, com seu exército já derrotado, montar-se em seu orgulho e se enfrentar com seu desafiador, só para se encontrar com a morte.

Este é o retrato do petismo atual. À procura de qual cavalo montará rumo a sua derrota via impeachment, via eleições municipais de 2016, presidenciais de 2018, ou mesmo na hoje menos provável hipótese de recuperação eleitoral. Mesmo esta hipótese de recuperação seria mais separada de bases operárias e de suas sombras de progressismo. Não faltam blogueiros a oferecer um programa a Dilma para esta batalha difícil e de derrota provável. Dificilmente esta aceitará, mas mesmo se aceitar, será, assim parece, para encontrar a derrota. Uma derrota que não necessariamente será “mortal” ou “eterna”, mas que já está ocorrendo. A separação do PT do “progressismo” já está se consumando, a separação da classe trabalhadora idem. Resta saber se poderemos, e ainda há tempo, erguer uma saída pela esquerda contra tanto o PT como a direita.




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