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DOSSIÊ 25 DE NOVEMBRO | Basta de feminicídios no Brasil: organizar as mulheres por nem uma a menos!

Há pouco mais de um ano e meio da Lei do Feminicídio no Brasil e há dez anos da Lei Maria da Penha, a realidade das mulheres brasileiras é de assassinatos frutos do machismo e de exploração capitalista sob suas costas.

Tassia ArcenioProfessora e assistente social

sexta-feira 25 de novembro de 2016 | Edição do dia

No Brasil, o dia internacional de luta contra a violência às mulheres é marcado por dados ainda estarrecedores: o país está na quinta posição mundial em números de feminicídios.

Conforme a Organização Mundial de Saúde (OMS), a cada 100 mil brasileiras, estima-se que 4,8 sejam assassinadas apenas por serem mulheres e segundo o mapa da violência de 2015, a situação é ainda mais grave em relação às mulheres negras – a taxa de homicídio cresceu em 54% nos últimos dez anos.

Os registros do Sistema de Informações de Mortalidade (SIM) mostram que 106.093 mulheres foram vítimas de homicídios no Brasil entre 1980 e 2013, sendo que no primeiro ano foram contabilizadas 1.353 mortes e em 2013, 4.762, ou seja, um aumento de 252%.

É ainda mais gritante saber, que em um país aonde a cada duas horas um feminicídio é cometido comprovadamente, o número real de assassinatos de mulheres pode ser ainda mais alto, pois as estatísticas do judiciário e da polícia em relação a assassinatos não registram o sexo da vítima e milhares de outros casos nem chegam a ser denunciados, por inúmeros fatores, como o papel da polícia frente aos casos e às denunciantes.

Sabemos que o feminicídio é o “último elo” de uma corrente de violência contra às mulheres que o Estado e suas instituições, a igreja e a patronal reproduzem e legitimam. Além do feminicídio, há outros diversos tipos de violência que oprimem as mulheres todos os dias, como violência psicológica, moral, agressões físicas, estupros, diferença salarial em relação aos homens, assédio moral, criminalização do aborto, ditadura dos padrões de beleza, dupla e tripla jornada, entre outros.

Dez anos da Lei Maria da Penha e um ano da Lei do Feminicídio: o que mudou?

A situação das mulheres - que são mais da metade da população mundial - representada pelos dados acima, responde a pergunta: para combater a violência contra às mulheres, é preciso muito mais.

A Lei Maria da Penha, como mostramos aqui, é insuficiente para dar uma resposta profunda ao problema das mulheres, pois apesar de representar um avanço no reconhecimento da desigualdade de gêneros, ela não age nas causas dessa diferença, e mesmo no que se propõe, ainda falha em efetivação.

Pelo mesmo caminho, está a lei de feminicídio sancionada em março do ano passado, que é um avanço no sentido de reconhecimento pelo Estado da existência e da necessidade de combate da violência patriarcal que mata as mulheres, mas como dissemos aqui, encontra seus limites na própria sociedade de classes e na essência do Estado, pois a desigualdade entre homens e mulheres é fruto da ideologia da classe dominante, que utiliza a opressão às mulheres para dividir a classe trabalhadora e explorar mais profundamente o conjunto dos trabalhadores, rebaixando o salário de todos e mantendo intactos os lucros dos grandes empresários.

Para as mulheres, que sentem na pele as palavras de Lênin, um dos dirigentes da Revolução Russa, “a igualdade perante a lei não é igualdade perante a vida”, o capitalismo reserva o trabalho doméstico, o trabalho precarizado e o tratamento como se fossem propriedade privada.

A lei do feminicídio, além dos limites já apontados, carrega a ideologia cisnormativa, excluindo as mulheres trans que enfrentam um quadro de violência ainda pior como colocamos aqui, considerando apenas por questões biológicas o que é ser mulher.

Por nem uma a menos, lutar como e contra quem?

A maioria esmagadora dos casos de feminicídios é praticada por conhecidos das mulheres assassinadas, namorados, maridos, ex-companheiros, pais, amigos, e para mudar esse quadro é preciso que as mulheres se organizem contra a ideologia dominante que dissemina a violência machista e contra o capitalismo que é sustentado por ela.

Existem grupos no movimento de mulheres que defendem que as mulheres devem se apoiar apenas em mulheres nas suas lutas, ocupando todos os cargos políticos, de chefia, entre outros. Entendemos que a representatividade é importante, mas há uma questão de classe que é fundamental: as mulheres trabalhadoras continuarão sendo oprimidas mesmo que por mulheres burguesas, pois na sociedade dividida em classes, as relações sociais sempre serão baseadas na exploração da trabalhadora pela burguesia, seja ela representada por mulheres ou por homens.

A representatividade das mulheres na política sem um programa claramente revolucionário, anticapitalista, pró-operário também não é um avanço na luta das mulheres, como podemos ver no governo de Dilma (PT) nesses anos, que renegou a pauta das trabalhadoras e das mulheres pobres.

É preciso superar também a ideia de que os inimigos das mulheres são os homens e batalhar por uma estratégia que entenda que para a libertação das mulheres é preciso que essa tarefa seja tomada pelo conjunto da classe trabalhadora, pois a luta contra a opressão e a exploração andam juntas, rechaçando qualquer alternativa de conciliação de classes, unindo a classe para derrotar o capitalismo e buscar a emancipação de toda a humanidade.

Frente ao cenário nacional, de ataques ao conjunto da classe trabalhadora pelo governo golpista, como a PEC 55, é ainda mais necessária a unidade entre as fileiras operárias, mulheres e homens, negros e brancos, efetivos e terceirizados para impulsionar em cada local de trabalho e de estudo uma forte campanha por nem uma a menos, pelo fim da violência contra às mulheres, organizada pelas entidades sindicais, estudantis, coletivos feministas, partidos políticos e grupos de direitos humanos.

Contra as ideias da direita da “Escola Sem Partido”, devemos exigir educação sexual e de gênero nas escolas, separação da Igreja e do Estado, para que haja uma formação contra o machismo, a homo-lesbo-transfobia, o racismo, onde nossa juventude possa se expressar livremente e serem sujeitos de suas próprias vidas, contra qualquer tipo de opressão.

Enfrentando o baixo investimento em políticas públicas para as mulheres que se manteve em todo o governo petista, enfrentando a retirada do Ministério das Mulheres, Igualdade Racial, da Juventude e dos Direitos Humanos pelo governo golpista, enfrentando a nova secretária para Mulheres, a golpista anti-aborto Fátima Pelaes, é preciso exigir casas abrigos para as mulheres cis e trans vítimas de violência, geridas por elas e grupos de mulheres e de trabalhadores sem ingerência da polícia e outras instituições do Estado.

O movimento de mulheres e entidades de trabalhadores também devem ser os responsáveis por acompanhar as investigações dos casos de feminicídio, para que todo o processo de luta contra a opressão tenha as mulheres e seus irmãos de classe na linha de frente, confiando nas suas próprias forças.

Taxando as grandes fortunas, dizendo não ao pagamento da dívida pública e colocando fim aos privilégios dos políticos é possível ter um plano de emergência que enfrente a violência contra às mulheres, que além das casas abrigos, as trabalhadoras possam ter acesso a subsídios, à saúde, moradia e trabalho digno e inspiradas nas mulheres polonesas, irlandesas e argentinas, possam lutar também nas ruas para tomar seu futuro em suas mãos.




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