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GUERRA SÍRIA | Ataques com mísseis destroem hospitais e centros de saúde na Síria

Dezenas de pessoas – ao menos 23 civis – morreram em três ataques com mísseis a três centros hospitalares e uma escola na Síria, em Azaz, próxima da fronteira com a Turquia, e na província de Idlib. No ataque à cidade de Azaz, na província de Aleppo, que alcançou um colégio e um hospital infantil, os mísseis foram atribuídos à aviação russa.

André Barbieri São Paulo | @AcierAndy

terça-feira 16 de fevereiro de 2016 | 00:00

Esta matança se seguiu a outro bombardeio ao centro de saúde apoiado pelos “Médicos Sem Fronteiras” em Marat al Nuaman, em Idlib. Todas as informações coincidem em atribuir ambos os ataques à aviação russa e ao exército de Bashar al Assad.

Na semana passada, a coalizão Síria-Rússia havia iniciado estes ataques em Aleppo, uma região que fica muito próxima à fronteira com a Turquia, porta de entrada principal da onda de refugiados sírios que vai para a Europa e que agora foi fechada pelo governo Erdogan em acordo com a Alemanha. O objetivo dos ataques é agravar a pressão sobre os governos ocidentais – através do bombardeio de zonas próximas à Turquia, para aumentar o fluxo de refugiados – para chegar às negociações de Munique em melhores condições para a reunião que “colocaria fim” ao conflito sírio.

Os bombardeios que alcançaram o centro de saúde deixaram sem cobertura milhares de pessoas. No último 5 de fevereiro, três pessoas morreram e seis, incluindo enfermeiras, ficaram feridas por um bombardeio no hospital de Tafas.

O governo turco, que quer manter de pé a todo custo seu acordo bilionário com a chanceler alemã, Angela Merkel, para manter os sírios fora da Europa, se esconde atrás das críticas aos bombardeios nefastos da Rússia. De fato, a Turquia não deixou de bombardear posições no norte da Síria, tendo admitido participar dos ataques à cidade de Azaz para impedir que “a localidade caia nas mãos das milícias terroristas curdas”.

O fracasso das negociações de Genebra – e de Munique nesta segunda – pôs em manifesto uma vez mais as linhas de falha da estratégia norteamericana para o conflito sírio. Depois dos fracassos do Iraque e Afeganistão e a crise da Líbia, Obama excluiu de suas variantes a opção de “mudança de regime” para a Síria, substituída por uma política errática de apoiar de maneira indireta alguns grupos “rebeldes”. Desde agosto de 2014, a prioridade dos EUA é derrotar o Estado Islâmico. Nessa política se inscrevem o acordo nuclear com o Irã, a colaboração tática com as milícias curdas do PYD em Rojava e as persistentes negociações com o presidente Putin para conseguir uma saída diplomática na Síria.

Esta nova prioridade colocou fissuras nas alianças históricas dos EUA no Oriente Médio, principalmente com a Turquia, que reprova Obama por apoiar as milícias curdas do PKK (Partido dos Trabalhadores do Curdistão), e a Arábia Saudita, que se vê altamente prejudicada pelos acordos nucleares de Washington com o Irã, seu principal rival regional.

O notável fracasso da diplomacia norteamericana no principal conflito geopolítico mundial

Se os acordos nucleares com o Irã, o degelo das relações com Cuba para facilitar a restauração capitalista na ilha e o “novo diálogo” de semicolonização da América Latina são vistos como “conquistas da política externa de Obama”, a guerra na Síria mostra toda a fragilidade da estratégia norteamericana no Oriente Médio.

Impedido pelas derrotas no Afeganistão e no Iraque de arriscar novamente a colocação de tropas terrestres em um país asiático, fracassando em estabilizar o regime iraquiano e sem qualquer controle sobre as disputas tribais na Líbia bombardeada pela OTAN em 2011, Obama cede cada vez mais à política de Moscou.

O Ministro de Assuntos Exteriores russo, Serguei Lavrov, conseguiu obrigar os EUA a aceitar um prazo de uma semana para “cessação de hostilidades” na Síria, ao qual Washington havia se oposto terminantemente. Assim, o regime ditatorial de Assad, protegido por Moscou, ganha tempo para se impor no terreno. Jornais como o The Economist – insuspeitamente apoiadora do imperialismo norteamericano – consideram que esta situação “reflete a fraqueza da posição negociadora de John Kerry e a bancarrota da política de Obama na Síria”. Como se as respostas deste jornal não saíssem dos bolsos dos lobbistas do imperialismo que apóiam Obama.

Essa situação em que há avanços e retrocessos parciais, mas nenhuma vitória definitiva no terreno também se expressa nas dificuldades dos Estados Unidos para encontrar uma saída diplomática, conciliando interesses contraditórios. Os EUA seguem sustentado o Exército Sírio Livre como sua principal opção. Mas o campo “rebelde” está fragmentado. Segundo a inteligência norte-americana, haveria 13 grupos de um tamanho considerável, mas mais de 1000 milícias e grupos locais, que abarcam um amplo arco político – laicos, islâmicos, moderados e radicais.

A guerra civil síria é talvez a expressão mais crua da derrota dos levantamentos da “primavera árabe”. Nos mais de quatro anos desde que começou deixou uma verdadeira catástrofe humanitária: 250 mil mortos e 11 milhões de desabrigados, a metade da população, dos quais 4 milhões fugiram do país. Mas tanto a intervenção norteamericana à frente da coalizão ocidental contra o Estado Islâmico, como a intervenção russa para sustentar o regime de Assad têm um caráter profundamente reacionário. Da mesma forma que as tentativas de estabelecer um “regime de transição” quando o esgotamento militar dos campos enfrentados assim o permitir.

E o "socialismo dos bombardeios" de Sanders?

Donald Trump e Ted Cruz, que disputam quem é mais de direita nas eleições primárias pelos Republicanos, pela islamofobia e xenofobia obviamente estão altamente satisfeitos com os bombardeios imperialistas na Síria, para retornar ao sonhado “grande passado norteamericano”. Hillary Clinton representa a espinhal dorsal de Wall Street. Resta perguntar ao autointitulado “socialista democrata” Bernie Sanders – e a todos aqueles que se maravilham com a "primavera Sanders", como o MES/PSOL no Brasil, que é guiado pelo nariz por uma expressão da socialdemocracia dentro do grande coveiro dos movimentos sociais nos EUA, os Democratas – o que há de socialista em defender como política externa a “maior aplicação” dos aliados regionais dos EUA no Oriente Médio nos bombardeios à população síria. O caso sírio é, de todo modo, a mostra de que o argumento de que “a política externa de Sanders não pode impedir de enxergar seus pontos progressistas” é vergonhoso.




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