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Dossiê Stonewall | Argentina: Há três anos da aprovação da lei de identidade de gênero

Há três anos da aprovação da lei de gênero na Argentina, é preciso lutar e se organizar para que os direitos do movimento LGBT não se transformem em letra morta.

terça-feira 12 de maio de 2015 | 13:09

Na Argentina, há 3 anos da lei de identidade de gênero sancionada em 09 de maio de 2012, mais de 4.235 pessoas obtiveram seu registro de nome social. A lei abriu um precedente mundial por ser a única no mundo que não patologiza a comunidade trans (transgênero e transexuais) e travesti. Além disso, a lei inclui em seus artigos, o respeito em todo o momento à identidade de gênero da pessoa e seu nome social escolhido (tenha ou não realizado o trâmite burocrático, visibilizando a realidade trans e travesti), a adequação sexual ao gênero (tratamentos hormonais e a cirurgia de resignação sexual) no Plano Médico Obrigatório, abrindo o leque para que médicos tenham que se capacitar para isso. Sem duvidas, juridicamente uma ampliação de direitos e reconhecimento de existência para transgênero, transexuais, intersexuais e travestis. Um exemplo para a América Latina no que se refere às leis LGBTTIQ.

Mas apesar disso, a igualdade diante a lei não é igualdade diante a vida

Há 3 anos da sua aprovação, em grande parte das províncias ainda segue a luta pela sua adesão e/ou regulamentação efetiva. O artigo 12 da lei que estabelece que: “Tratamento digno. Deverá respeitar a identidade de gênero adotada pelas pessoas, em especial por meninas, meninos e adolescentes, que utilizem um nome de escolha distinto do registrado na certidão de nascimento. A partir do seu próprio requerimento, o nome de escolha adotado deverá ser utilizado para intimidação, registro, arquivo, chamado e qualquer outra administração ou serviço, tanto em âmbitos públicos como privados. Naquelas circunstâncias em que a pessoa deva ser nomeada em público deverá se utilizar unicamente o nome de escolha que respeite a identidade de gênero adotada.”

Muitas instituições de caráter público ou privado (clínicas, estabelecimento educativos, etc.) omitem a parte “naquelas circunstâncias em que a pessoa deva ser nomeada em público deverá se utilizar unicamente o nome de escolha que respeite a identidade de gênero adotada”. A realidade é que se a pessoa trans ou travesti não sabe desse artigo, se torna vulnerável quando deve realizar trâmites ou ao simples fato de votar nas eleições quando ainda não haja iniciado a mudança ou ainda esteja em processo. É um direito adquirido que a pessoa em questão deve fazer valer e fazer aqueles que desconheçam o enunciado comecem a aplicá-lo.

Também o artigo 11 tem falhas hoje em dia após 3 anos de sua aprovação. Este expressa que: “Todas as pessoas maiores de (18) anos de idade poderão, conforme o artigo 1º da presente lei e afim de garantir o gozo de sua saúde integral, ter acesso a intervenções cirúrgicas totais e parciais e/ou tratamentos integrais hormonais para adequar seu corpo, incluída sua genitalidade, sua identidade de gênero, sem necessidade de requerer autorização judicial ou administrativa”.

Em Mendoza (que aderiu à lei ano passado), a regulamentação da lei na saúde é obrigatória. Os tratamentos hormonais estão parcialmente cobertos, e a assistência social faz vista grossa na hora de incluir no Plano Médico obrigatório.

Também é importante ressaltar que apesar dos tratamentos hormonais e das intervenções cirúrgicas estão parcialmente e/ou totalmente cobertas, ainda restam muitas mulheres que optam por cirurgia e métodos de risco não avaliados pela medicina para “adequar” seu corpo.

O silicone industrial, as pílulas anticonceptivas (parte da antiga cultura e ainda presente da “auto-medicação e cirurgias clandestinas) se fazem presentes nas comunidades trans e travestis mais vulneráveis.

E como já era de se esperar, é necessário enfatizar a questão de trabalho e educação das pessoas trans e travestis.

A lei 26.150 de Educação Sexual Integral tem falhas quando se trata de aplicá-la, pois estabelecimentos educativos se recusam a fazê-lo. Provocando uma paralisia não só em dar conhecimentos aos jovens sobre a sexualidade humana, como também os métodos anticonceptivos. A Igreja segue se metendo na educação colocando uma barreira entre a integração e o conhecimento para a juventude.

As dificuldades de inclusão no trabalho e na educação se faz mais presente após estes 3 anos, a inclusão educativa segue sendo um problema para a comunidade trans e travesti. As agrupações LGBTTIQ cooptadas pelo kirchnerismo deram uma alternativa paliativa a isso, formando os bacharelados trans, o qual não soluciona o problema de fundo da inclusão, estas escolas secundárias permitem que as pessoas trans e travestis possam completar seus estudos.

Porém, o desafio real é, e sempre foi, INCLUIR, e isso se alcança aplicando o Programa Nacional de Educação Sexual Integral (ESI) de maneira efetiva e promovendo um ambiente inclusivo dentro dos estabelecimentos já existentes. É difícil, mas é o que se deve alcançar, pois as pessoas trans e travestis tem a mesma capacidade que qualquer outro ser humano. Segregar só tapa a realidade de um problema ao qual o governo não pôde encontrar a solução.

No âmbito do trabalho, é conhecido que o documento deu reconhecimento jurídico para as pessoas trans e travestis. Porém, a inserção no mercado de trabalho segue sendo um problema, a crise capitalista nos coloca contra todos e todas as trabalhadoras. O trabalho em si é um tema muitíssimo mais profunda para todas as pessoas.

Não tem motivo para que a prostituição seja a única saída para a comunidade, se deve combatê-la (atacando a prostituição como vulneração sistemática a qual o sistema capitalista e patriarcal te arrasta como opção, sem estigmatizar quem a exerça) mediante programas de inserção trabalhista pública e estatal que pouco a pouco vá tornando mais visível a realidade e rompendo o estereótipo.

Há 3 anos da lei se faz obrigatório que os movimentos LGBTTIQ voltem a retomar o caráter combativo e de esquerda que tiveram desde suas raízes. Restam muitas conquistas por alcançar e ninguém mais do que nós para alcançá-las nos organizando independentemente do Estado. Levantando as bandeiras de companheiras e companheiros LGBTTIQ que deram sua vida para que hoje possamos ter esses avanços jurídicos.
Se faz mais evidente que não é só lutar por igualdade jurídica, senão que fica um longo caminho para que possamos alcançar uma igualdade como grupo humano. E para isso há que seguir lutando até alcançarmos. As leis não devem apenas permanecer como letra morta. É necessário aprofundá-las jurídica e socialmente para que possamos ver uma transformação verdadeira.

Publicado originalmente em: http://www.laizquierdadiario.com/spip.php?page=movil-nota&id_article=15871

Tradução: Adriano Favarin




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