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AEROPORTOS E COVID-19 | A realidade nos aeroportos: demissões massivas, exposição ao COVID-19 e fragmentação operária

Frente a crise econômica e social com o COVID-19 enquanto as mascaras, testes e leitos de hospital atrasam, o que não demora são as demissões. O aeroporto de Guarulhos esta sendo assolado pelas demissões, o principal pólo econômico da cidade e uma das maiores concentrações operarias de São Paulo, que reunia cerca de 37 mil trabalhadores. As companhias aéreas, lojas e terceirizadas vem demitindo e afastando gradativamente centenas de funcionários sem que haja qualquer resposta dos sindicatos.

sexta-feira 17 de abril de 2020 | Edição do dia

Apenas nessas ultimas semanas a empresa Duty Free demitiu cerca de 400 funcionários, e a empresa LSG Sky Chefs, uma das maiores do ramo de “catering” (bufê de alimentos para a aviação), demitiu mais de 300 pessoas. Contudo é possível que mais empresas tenham demitido na mesma semana sem que houvesse qualquer resposta articulada pelos sindicatos, tão pouco é divulgado o numero exato dos ataques. Apesar de o aeroporto ser uma estrutura que concentra milhares de trabalhadores, ela é completamente fragmentada em diversos sindicatos, em setores de serviço e comércio, terceirizadas e companhias aéreas.

Os prognósticos econômicos apontam para uma crise nunca vista desde a grande depressão de 1929. As demissões não são pontuais, ou conjunturais, ou seja, os empregos perdidos não vão voltar, qualquer visão gradualista ou de que as coisas “voltarão ao normal” daqui uns meses se provará equivocada. Por isso é preciso defender os empregos agora e impedir que os capitalistas se aproveitarem da pandemia para “descartar” força de trabalho excedente, aumentar a taxa de exploração daqueles que seguem empregados e assim descarregar a crise na vida dos trabalhadores.

As companhias aéreas tão pouco informam dados precisos dos demitidos, contudo o setor aéreo é um dos mais afetados pela crise, sendo diagnosticada como muito mais profunda do que a vivida na época do 11 de setembro – quando houve o ataque as torres gêmeas nos EUA. A AZUL encerrou suas operações em Guarulhos, mantendo sua sede operando em Viracopos (Campinas), e com ameaça de entrar em falência. Ao todo haviam cerca de 14 mil funcionários contratados pela empresa, destes 7500 aderiram a licença não remunerada pressionados em “manter o emprego”, ainda que formalmente, uma vez que não receberão salário tão pouco há garantia que não haverá demissões futuras.

Quanto aos outros que não aderiram a licença, há relatos de demissões na base de Guarulhos, somando entre a Azul e a Gol aproximadamente 300 demitidos. Tanto a Gol como a LATAM também afastaram sem remuneração seus funcionários, nesta última foram cerca de 5700 afastados. Pautadas em um discurso de “todos tem que fazer sacrifícios”, omitindo o capital acumulado por anos de altos lucros, as empresas deram como opção ou a redução de jornada com redução de salários, ou o afastamento não remunerado. Somente a Gol em 2019 teve lucro liquido de R$ 648 milhões. O fato é que milhares de aeroviários estão com salários cortados ou afastados sem salário no meio de uma pandemia e muitos estão sendo demitidos, o que se trata de um enorme ataque das companhias aéreas, ataque diretamente proporcional a hipocrisia das chefias e acionistas das empresas que falam em “todos juntos” demagogicamente enquanto mantém seus milhões, suas mansões e acesso aos melhores hospitais.

A realidade dos trabalhadores é bastante distinta, apesar de ser o trabalho destes que mantém os aviões voando, os passageiros sendo atendidos e o aeroporto funcionando, muitos são obrigados a morar em locais precários e favelas, é comum aqueles que trabalham de 12 a 16 horas por dia em 2 empregos para completar renda, debilitando completamente a saúde em jornadas extenuantes e pouco sono. Os chamados “part time” são os que mais acabam tendo que viver em dois empregos, pode parecer contraditório, contudo o fato da legislação trabalhista permitir a redução da jornada a 4 horas, permitiu, por sua vez a extensão da jornada de trabalho na sua “totalidade”. É a nova escravidão moderna onde o trabalhador precisa ter dois trabalhos e jornadas que vão bem além das 8 horas.

No caso das empresas terceirizadas o numero de demitidos e afastados é ainda mais nebuloso, a Orbital (maior terceirizada do aeroporto) praticamente parou de prestar serviço afastando grande parte dos seus funcionários. Há relato de demissões nas empresas de limpeza dos aviões e do aeroporto, somado aos funcionários de lojas e restaurantes, e setor hoteleiro – além das companhias aéreas – podemos estimar em milhares de demitidos e afetados pela crise, um enorme ataque aos trabalhadores.

Aos que seguem trabalhando com a sombra da demissão nas costas, acabam pressionados a se exporem ao vírus e se submeter a todo tipo de exploração para não perderem o emprego. As empresas estão se aproveitando da crise para naturalizar uma condição de trabalho mais extrema e maior exploração agregando funções e diminuindo o quadro de funcionários. Enquanto fazem demagogia jogam os trabalhadores a possibilidade de adoecerem trabalhando, mesmo sendo uma das categorias mais expostas desde o inicio da crise, não fizeram nenhum teste nos funcionários, e pior as empresas não informam se há algum funcionário doente ou afastado pela doença, expondo a todos e autoritariamente impedindo que cada trabalhador saiba se há ou não contaminação no seu turno e local de trabalho.

Aeroportos: a fragmentação operaria na sua maior expressão

Uma das formas que o capitalismo neoliberal teve para controlar a enorme classe trabalhadora em expansão foi fragmentá-la. No aeroporto são diversas empresas terceirizadas que foram ganhando mais espaço conforme as companhias aéreas diminuíram seu pessoal efetivo e contratando o serviço de terceiras. Fazendo isso, mesmo os funcionários trabalhando juntos e muitas vezes cumprindo funções semelhantes e complementarem são representados por sindicatos diferentes, e subjetivamente influenciados por uma ideologia onde a depender do uniforme que se usa cada trabalhador ganha um valor distinto.

A fragmentação enfraquece uma luta comum, esse papel traidor dos sindicatos de manter a divisão da classe trabalhadora é um dos pilares de sustentação do domínio burguês, na medida em que enfraquece a luta operária garante que ela fique sempre restrita nos limites do possível dentro do capitalismo, e de demandas econômicas. Nessa pandemia estamos vendo muitos sindicatos contribuindo para acordos patronais que prejudicam os trabalhadores e aceitam as demissões e os afastamentos. Como a Força Sindical que aderiu a Bolsonaro e patrões e criou um app que facilita redução salarial.

SAIBA MAIS - Força Sindical adere a Bolsonaro e patrões ao criar app que facilita redução salarial

Um exemplo dessa divisão é o sindicato que representa os trabalhadores das companhias aéreas, onde apesar de ser o mesmo sindicato para a AZUL, Gol, LATAM e outras, ele negocia separadamente com cada companhia aérea, enfraquecendo e dividindo a categoria.

Contudo esse que é um dos maiores trunfos do neoliberalismo, a fragmentação e super exploração dos trabalhadores, pode se reverter no seu contrário. Nas grandes revoltas que vimos no Chile e França no ano de 2019 foi possível observar que os setores que saíram as ruas foram o que chamamos de “perdedores absolutos” da globalização, ou seja, os setores mais precários, imigrantes, trabalhadores de aplicativo e sem representação sindical. Essa própria composição social deu o “tom” dos protestos, sendo mais radicalizados, realizados por setores que pouco ou nada tem a perder. A crise que passamos agora deve estender esses setores precários, aumentando exponencialmente o desemprego, os trabalhadores “ubernizados” e precarizando ainda mais os funcionários com carteira assinada.

A somatória da crise social, do drama humano causado pelo vírus, com o aumento do desemprego e maior precarização do trabalho por resultar em processos explosivos e revoluções, onde os sindicatos acostumados com “calendário de luta” e acordo coletivos, ou com trabalhar diretamente e abertamente para a patronal pode-se ver rapidamente superado por possíveis revoltas que não seguem o padrão e a rotina sindical. Além da expansão objetiva da precarização e do desemprego, também já se opera uma mudança subjetiva na localização desses trabalhadores na sociedade, onde a primeira linha que segue trabalhando no meio do COVID-19 são justamente os mais precários, aqueles que vão entregar comida na casa das pessoas, as enfermeiras nos hospitais, o setor do transporte e da limpeza.

Essas tendências também são validas para os aeroportos, contudo se trata de uma posição totalmente estratégica dos transportes e logística nacional, na qual a burguesia soberbamente precarizou e atacou os direitos dos trabalhadores. Ainda que não seja o cenário imediato, as perspectivas da crise que se avizinha pode levar a mudanças rápidas da consciência dos trabalhadores e das suas condições de vida. O antigo gradualismo e o mundo como entendemos até hoje não existe mais.




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