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Andrea D’Atri@andreadatri

quinta-feira 14 de abril de 2016 | Edição do dia

Imagem: O fim da greve, em Bread and Roses Centennial Exhibit

Já faz mais de um século da luta das mulheres pelo direito ao voto. Já faz meio século desde o início da luta das mulheres pelo direito ao prazer, por dispor dos nossos corpos e de nossas capacidades reprodutivas, por poder viver livremente nossa sexualidade.

Conseguimos o direito ao voto e à educação universitária; o direito a trabalhar sem que nosso pai nem nosso marido tenha que nos dar permissão para isso. Também obtivemos o direito ao aborto, em muitíssimos países do mundo. E o direito de nos casarmos com outra mulher. E o direito ao divórcio também. E o direito a que a autoridade sobre nossos filhos e filhas seja compartilhada com o progenitor masculino. E conseguimos que, pelo menos nas leis, seja estipulado que devemos receber o mesmo salário que os homens pela mesma tarefa. E também que tenhamos licenças maternidade e amamentação. Conquistamos o direito de ser astronautas e trabalhadoras do petróleo, assim como professoras, enfermeiras ou empregadas domésticas. Conseguimos que o regime político, com todas as suas instituições, nos reconheça como vítimas. Que socialmente tenha ampliado o sentido comum que o machismo existe e somos vítimas.

Hoje somos reconhecidas como vítimas. Somos vítimas da violência de gênero, dos sequestros motivados pelas redes de tráfico de pessoas, de assédio e abuso sexual, de estupros nas ruas, no táxi, na escola, no trabalho, em casa. Vítimas de uma exploração que chega a níveis insuportáveis que acabam com nossa saúde, com nossa vida. Somos, especialmente, vítimas colaterais das guerras. E somos vítimas do feminícidio. Depois de mais de um século de lutas das mulheres, conseguimos que as mulheres sejam reconhecidas fundamentalmente como vítimas. Mas quando nos esmagam no nosso lugar de vítimas, sem falar de nossas lutas e das conquistas que vieram com essas lutas, nos fazem vítima novamente. Porque querem mostrar que somos vítimas impotentes. E para conseguir isso, é necessário apagar as lutas de muitas gerações de mulheres, daquelas que fizeram história com seu próprio nome e daquelas anônimas que nos trouxeram suas mobilizações, seus anseios, seus esforços abnegados e seu heroísmo.

É melhor corrigir o que foi dito acima: hoje somos reconhecidas como vítimas impotentes. E as vítimas impotentes só podem ter ressentimento. E do ressentimento nunca saiu nada de bom. Do ódio contra as condições vergonhosas em que viveu e vive grande parte da humanidade, ou seja, do ódio contra a opressão, podem surgir potentes convicções para o combate.

Não optamos por ser as vítimas impotentes que o patriarcado quer que sejamos. Optamos pelas convicções poderosas que se aninham no ódio produtivo de nos reconhecer como vítimas de uma ordem social que fede.
Não é um ódio pessoal, subjetivo. É o ódio contra esse atual velho mundo. Louise Michel disse há anos: “Cuidado com as mulheres quando sentirem nojo por tudo que as rodeiam e se levantarem contra o velho mundo. Nesse dia, nascerá o novo mundo!”.

Cuidado conosco, patriarcado.




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