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COLUNA | A política do centrão e os descaminhos do centro

O julgamento de ontem que declarou Moro suspeito já praticamente confirma a possibilidade de Lula se candidatar a presidência. Os políticos do centrão, essa direita dura e fisiológica herdeira da ditadura, reembaralha as cartas e se divide entre os que apoiam Bolsonaro e os que passam a colocar seus ovos nas duas cestas. Os defensores de uma candidatura de centro-direita esperneiam enquanto tecem novas ilusões

Thiago FlaméSão Paulo

quarta-feira 24 de março de 2021 | Edição do dia

A colunista do jornal O Globo expressou bem o impasse que o tucanato e outros setores da oposição neoliberal ao bolsonarismo sem encontram, na sua tentativa de ocupar um espaço ao centro do espectro politico para se viabilizar eleitoralmente depois do fracasso histórico de 2018. Diz ela que “cresce nos meios políticos e entre os analistas a crença de que o segundo turno de 2022 pode se dar sem a presença de Jair Bolsonaro”. Esse é o nível a que caíram analistas políticos que tentam viabilizar uma candidatura de centro-direita para 2022, mais do que nunca se apoiando nos seus desejos e vontades do que nos fatos e tendências da realidade nas suas analises.

Enquanto professam sua crença, procuram alguma simpatia que milagrosamente lhes tire do atoleiro em que se meteram desde 2018. A mesma Vera Magalhães revela que “fui procurada por articuladores de partidos com composições as mais diversas. Alckmin-Mandetta? Alexandre Kalil-Luiza Trajano? A mais manjada Luciano Huck-Moro?” e ela mesma completa “Em cada uma há senões, guerras de egos, vetos dentro desse e daquele partido e hesitação dos envolvidos.” Citamos Vera Magalhães justamente por que ela expressou melhor do que ninguém esse impasse.

A hesitação dos envolvidos nessas articulações respondem a problemas e contradições muito mais profundos. Enquanto o conjunto do agronegócio, a maioria dos banqueiros, industriais e comerciantes sustenta o governo Bolsonaro, a oposição neoliberal não tem nenhum programa econômico alternativo ao do governo, nem a possibilidade de disputar com Lula os eleitores da tradicional base petista. Os setores empresariais ligados ao agronegócio são o que prestam o apoio mais sólido ao governo Bolsonaro e disciplinam boa parte dos deputados do centrão ligados a frente ruralista. Se nas finanças, a carta organizada pelo Itaú e pelos economistas tucanos significou um tiro de advertência a Bolsonaro, a maioria do setor não avança nem a essa oposição light ao governo.

A reunião de hoje de Bolsonaro com representantes dos “demais poderes” ilustra muito bem o atual cenário político. Bolsonaro está pressionando pelos próprios setores empresariais que o apoiam a ter uma gestão um pouco mais responsável da pandemia – nem que seja na retórica. Está mudando o discurso e tentando se posicionar como o campeão da vacinação, mas está fazendo isso de forma organizada, buscando manter uma coesão dos setores que lhe apoiam. Estiveram representados na reunião a presidência das casas do Congresso, o presidente do STF, os governadores mais próximos ao governo federal, além do governador de Alagoas, do MDB, representando os governadores do Nordeste. Foi criado um comitê de combate a pandemia, do qual só não participaram, direta ou indiretamente, os governadores tucanos.

Essa reunião alinhou discursos entre os setores mais bolsonaristas dos governadores, apoiadores da Lava Jato como Fux, e os representantes das alas do centrão que apoiam Bolsonaro. Cortou, por hora, as articulações que visavam que o Congresso tomasse a liderança dos esforços contra a pandemia, isolando o governo federal. Tanto Arthur Lira como Rodrigo Pacheco saíram da reunião afirmando que a liderança neste comitê caberia naturalmente à presidência da republica, enquanto o governador de Goiás, Ronaldo Caiado do Dem foi no mesmo sentido, dizendo que a reunião foi importante por que estiveram representados todos os poderes.

O PSDB acusou o golpe, e foi praticamente o único setor político que se colocou por fora desse pacto. Eduardo Leite afirmou que a reunião não passa de foto para manchete. Os governadores do Nordeste, no entanto, soltaram carta junto a outros governadores defendendo um auxilio de 600 reais (inclusive aliados de Bolsonaro, além dos tucanos) em que apesar das criticas a Bolsonaro, reafirmam que é ele que deveria exercer “o papel de liderança e coalizão em nome do país”, abandonando na pratica qualquer política de impedimento do presidente.

Mais do que nunca, no momento em que batemos novos recordes de mortos por covid, precisamos de organização e mobilização da classe trabalhadora e da juventude para apontar um caminho alternativo. Se dependermos das articulações dos “poderes” ou dos governadores tucanos a catástrofe sanitária só vai se agravar nas próximas semanas.




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