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NEGRAS E NEGROS | A origem do racismo e a luta central dos negros e das negras

Com este artigo busco escurecer a afirmação de Malcolm-x “Não existe capitalismo sem racismo”, que pode parecer estranha já que muitos diriam: “Mas a escravização veio antes do capitalismo!”, “existia escravos antes do capitalismo!” e tantas outras argumentações para defender que o capitalismo não criou nada novo ou mesmo que não é um sistema tão ruim assim. Bom, então vamos lá:

Jenifer TristanEstudante da UFABC

quinta-feira 9 de junho de 2016 | Edição do dia

Se é verdade que já existia escravidão em sociedades pré-capitalistas, o modo como ela se dava era profundamente oposto a escravização da população africana. Nessas sociedades a escravidão de um povo sobre o outro se dava frente as guerras, as disputas de território, em muitos locais como na Grécia visualmente não se podia nem diferenciar escravos de homens livres, nem pela cor e nem pela vestimenta, a questão racial não era um fator para a escravidão e sim interesses entre as populações.

É necessário entender que a burguesia que já se gestava no seio do feudalismo, que já era dona de engenhos e alguns meios de produção ainda rudimentares, encontrou na escravização africana uma forma altamente lucrativa de se desenvolver. Com isso o cristianismo contribuiu firmemente para o desenvolvimento de teorias que justificassem tamanha exploração para que garantirem seus lucros e em base à diferença racial começam a reproduzir a ideia de que os negros e negras “não tem alma”, logo “não são serem humanos” com o intuito de inferiorizar os negros e negras e desumanizá-los para que virassem de fato “instrumentos de carga e trabalho”. A única escravização que se dá pela inferioridade e desumanização é a escravização dos negros!

Acumulação primitiva e a super exploração do trabalho

Para desenvolver o sistema capitalista foi necessário um acúmulo de capital para que a burguesia pudesse desenvolver o seu sistema econômico próprio, “O comércio de escravos e a escravidão produziram fortunas que assentaram as bases para a mais importante das primeiras indústrias do capitalismo, que por sua vez serviu para revolucionar a economia do mundo” (P. 14)

Pois a escravização dos negros e negras, sem dono, sem alma, dos seres inferiores, serviria justamente para assim ter uma produção de forma muito rápida, ágil e habilidosa com o trabalho escravo sem tem que gastar nada com isso, já que não existe pagamento de salários, o lucro aumenta. Os lucros eram gigantescos, principalmente em tempos de bonança.

Assim consolidando espaço econômico e político já no seio da sociedade feudalista esse período de acumulação de capital foi longo e tortuoso no Brasil. Esse processo se inicia com a produção de açúcar no início do século XVI e o fim da escravização se dá apenas no fim do séc. XIX, ou seja tempo o suficiente para essa acumulação e mesmo da criação de uma ideologia racista, que até hoje é perpetuada.

Esse processo não se deu de forma pacífica como querem nos fazer crer a história contada pelos capitalistas, para Marx: “A história da humanidade é a história da luta de classes” e esses escravizados viviam se revelando contra os açoites e a violência extrema e irrestrita, já que na visão dos senhores de escravizados eles não eram gente, para garantir a subordinação aos senhores de escravizados e capitães do mato, para garantir que fizessem da maneira mais precária o trabalho duro e forçado, nas plantações, engenhos e etc.

Para o capitalismo o racismo é seu aliado

Essas revoltas, vão gerando organizações que prezam por sua liberdade e contra a superexploração que viviam, mesmo com o domínio econômico e político da situação, os senhores de escravos não podiam controlar totalmente os escravizados que organizavam rebeliões e fugas. Que também construíram além do desenvolvimento para o capitalismo com o fim da escravidão, mas mesmo com o seu fim os negros após toda a cultura introjetada de inferioridade não podiam ser simplesmente reinseridos dentro de uma sociedade que os julgava “não-humanos”.

Com o desenvolvimento do trabalho no capitalismo e industrialização, os negros foram inseridos de maneira muito desigual fruto do processo de escravização, sendo deixados para exercerem apenas os trabalhos mais pesados, com baixa remuneração.

O capitalismo se utiliza do racismo, que foi conveniente para sua consolidação, para manter a classe trabalhadora dividida, para que as opressões sejam parte de um entrave para que negros e negras e brancos e brancas possam se organizar contra aqueles que nos exploram e oprimem. Ainda hoje o trabalho dos negros e negras é o mais precário, mas isso ao contrário de ser benéfico para os trabalhadores brancos só contribui indiretamente com a nivelação por baixo dos salários, fazendo com que a média dos salários de todos sejam rebaixados para garantir assim maiores lucros para os donos das fábricas e grandes detentores do capital. O capitalismo só conseguiu existir pois os negros foram a mão-de-obra da construção da acumulação de capital e até hoje seguem sendo o setor pior remunerado, mesmo depois de tanto dinheiro gerado pelo trabalho das mãos negras que cá vieram rápidas para esse país.

Só a luta pelo fim do capitalismo pode superar o racismo

Existem várias teorias de fim do racismo, teorias que muitas vezes se baseia legitimamente na experiência do racismo, que deslegitima os negros, e por isso quer nos separar dos brancos, ou pensam em construir um capitalismo negro. Ainda que seja legítimo esse sentimento frente ao racismo histórico produzido e reproduzido pelos brancos, existe uma luta que é indissociável do combate ao racismo que é a luta de classes.

Não colocamos isso para diminuir a importância da intensidade da luta que devemos travar contra o racismo, que massacra física e psicologicamente negras e negros no mundo tudo, mas que uma resposta definitiva precisa questionar a fundo o capitalismo e a lógica do capital que se perpétua ainda hoje, não pode ser dada sem avançarmos para destruir a ideologia dominante racista e o sistema material que a difunde. Nós negros e negras precisamos de forma mais profunda combater a origem de nossa opressão e nesse sentido se enfrentar com o capitalismo para que nós mesmos passemos a gerir nossos interesses enquanto negros e negras e enquanto trabalhadores.

Nossa luta deve se dar em primeiro lugar contra essa burguesia, essa elite branca que utiliza de todas as formas possíveis de racismo que contribuem para a marginalização dos negros, ou seja empregos precários, a não inserção plena na universidade, a perseguição e extermínio da polícia que tem o objetivo de nos caçar pelas ruas, nas favelas, morros e periferias que existem até hoje afastadas dos centros com maioria de negros, para criar uma zona da cidade eugênica, "livre de negros". Esse é o modelo de sociedade que vivemos sobre a lógica do capital.

Precisamos nos unir enquanto classe de oprimidos e nesse sentido no Brasil a revolução será negra pois, somos o maior país negro fora do continente africano e precisamos nos aliar as mulheres, aos LGBT, aos brancos da classe trabalhadora, pois todos sofrem com o racismo direta ou indiretamente, como no caso dos salários e direitos rebaixados, por exemplo. Só juntos podemos por um basta a essa condição de miséria que a burguesia nos garante para que ela possa viver e gozar do nosso trabalho.

E para fazer coro com o Malcolm X do início do texto é preciso acabar com o capitalismo para que os negros possam estar a frente de gerir seus próprios interesses, interesses esses que são de classe, com o objetivo de sermos de fato livres e iguais na vida, respeitando as diferenças dos indivíduos, socializando nossas capacidades no intuito de produzir conhecimento humano, potencializar a humanidade e não um sistema podre e falido que nos usa assim como as mercadorias, como coisas.

A revolução decerto virá, pois a fome, a desigualdade, a exploração já são marcas de um sistema que não deu certo. Negros e negras, Indígenas e trabalhadores brancos e trabalhadoras brancas devem se unir, para que possamos superar isso com a moral dos escravizados que, insurrectos e indomáveis, lutaram contra o sistema que os oprime. Essa é nossa tarefa central!


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