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ESPANHA | A origem do Podemos e do M5S na Itália está na crise da esquerda tradicional

O Movimento 5 Estrelas de Beppe Grillo e sua ideologia xenófoba e nacionalista. Uma comparação com as origens do Podemos. O reformismo e as tarefas revolucionárias.

Elder Rambaldi Partido Comunista do Lavoratori | Itália

sexta-feira 29 de julho de 2016 | Edição do dia

Além de uma reflexão geral, neste debate quero evidenciar também alguns aspectos da vida política italiana que, acredito, podem contribuir com elementos de reflexão. Em particular sobre as similitudes entre os fenômenos do Podemos e o Movimento 5 Estrelas (M5S). Semelhanças importantes desde suas origens, passando por seu desenvolvimento, seus elementos organizativos e as implicações para a esquerda.

A origem comum do Podemos e do M5S está na crise do capitalismo e na crise da esquerda tradicional. Ambos fenômenos nascem em um contexto de crise de representação.

Na Itália, em um contexto de profundo estancamento das lutas e do isolamento da esquerda, nasce o M5S sobre bases reacionárias. No Estado Espanhol, depois do movimento dos indignados, nace o Podemos sobre bases radicais de esquerda.

A esquerda tadicional, desacreditada por anos da política de colaboração de classe (em vários níveis), e incapaz, por sua genética reformista, de representar uma alternativa frente aos ataques da crise, permitiu o surgimento destas forças.

O M5S deu seus primeiros passos apoiando-se sobre os escândalos da casta política, construiu uma imagem midiática como defensor e representante dos cidadãos comuns assumindo as consignas de mandar todos embora ou abolir os privilégios dos políticos.

O M5S construiu seu modelo organizativo de maneira extremamente vertical, com um único líder que manda (o milionário Beppe Grillo) e um método de votações por meio da web, uma democracia instruída.

A imposição deste movimento prevê a centralidade do cidadão, e por conseguinte a eliminação das diferenças de classe. Uma cabeça um voto, então, a consequente impossibilidade de organizar setores de interesse de classe.

Uma força para a gestão do capitalismo, certamente não antisistema como se declaram, já que envia constantemente garantias ao capital internacional. Posições políticas adaptadas, com uma agenda política flexível para chegar a todos.

Podemos ver então quantas semelhanças há com o Podemos. Iglesias, como um verdadeiro inútil professor de Ciência Política, teve tempo para estudar o êxito do fenômeno 5 Estrelas.

E se no Estado Espanhol a esquerda se adaptou frente ao Podemos, na Itália a esquerda sempre vacilou diante o M5S, embora este se caracterize como um movimento populista reacionário. É verdade que existem algumas posições progressistas (algumas batalhas democráticas) mas de maneira oportunista. Seu coração persiste reacionário. Além de posições xenófobas e de um controle totalitário do partido, seu projeto se configura como uma República de Plebiscito” via web.

Na questão central do trabalho (público e privado) o M5S sempre se alinhou aos interesses da classe trabalhadora. “O trabalho não existirá mais, e não vale a pea defendê-lo” dizem; a defesa do posto de trabalho é eliminada em favor da renda básica; os trabalhadores públicos são qualificados como um lastro que deve diminuir, e em relação à última reforma trabalhista (do governo Renzi) os 5 Estrelas claramente não avançaram nas críticas.

O M5S se declara contra os sindicatos enquanto tais (insistem na ideia de que é uma cabeça um voto, e estas organizações são coisas do século XIX), e exige financiamentos e subsídios para a burguesia, seu principal setor de referência de fato está na pequena e mediana burguesia. Recordemos por último sua filiação europeia ao lado do euroscéptico e direitista UKIP britânico (formam um grupo comum no Europarlamento).

Frente a esta situação, um grande setor da esquerda defende o argumento de que muitos trabalhadores votam no M5S, que esta força representa o “mal-estar e a rebelião encoberta e difusa”, e que é uma força alternativa ao Partido Democrático no poder. Também setores da extrema esquerda (autônomos, neoestalinistas e sindicatos de base) se encontram encantados e lhe dão força.

Ambos, esquerda e extrema esquerda, buscaram alianças eleitorais com Grillo muitas vezes.

Último fato grave: o secretário geral da Refundação Comunista (partido da esquerda europeia) declarou ter votado no M5S no segundo turno das eleições municipais. Grande parte da esquerda na Itália propõe copiar o exemplo espanhol: replicar a aliança entre o Podemos e a Esquerda Unida.

Atualmente o M5S dirige alguns importantes municípios (desde junho Turin e agora Roma também), e além disso já demosntrou sua própria política em oposição à classe trabalhadora. Agora, à luz da forte crise de Renzi, se situa provavelmente como a primeira força política do país.

A resposta frente ao perigo e ao antioperário projeto do M5S deve ser uma crítica de classe e uma política revolucionária.

Podemos (no Estado espanhol), se olhamos seu projeto político geral, não podemos certamente definí-lo como um movimento reacionário. Mas seguramente é uma força que se choca com os interesses da classe trabalhadora, uma força ilusória e perigosa.

Se declara além das divisões de classe e se refere genericamente aos cidadãos. Tem uma política adaptada com o desejo de conquistar a todos; tem uma organização interna centralizada com poucos espaços democráticos; contínuas são as garantias que se alia ao capital internacional; se proõe como protagonista na construção de um novo compromisso histórico (alianças locais com o PSOE e a perspectiva de governar com este partido)); demonstra um contínuo respeito ao Estado e à monarquia. E propõe a “ordem” como elemento central.

Podemos deseja engolir e anestesiar toda a esquerda espanhola, jogou não somente em prol de bloquear as mobilizações populares, senão para eliminar as experiências destas mobilizações. E segue dizendo que a mudança pode chegar com as eleições e com o trabalho de administração do estado capitalista burguês (em contradição com as origens do Podemos).

As novas experiências dos governos locais do Podemos e das candidaturas da unidade popular marcam um balanço negativo.

Mas em tudo isto a definição do Podemos como fenômeno neorreformista, como fez o Secretariado Unificado da IV Internacional não me parece correta, porque parece pressupor uma postura diferente e privilegiada a estes fenômenos. E por isso não tem acordo com a possibilidade, no passado, da hipótese que levantou o companheiro de IZAR, ou seja a tática do entrismo. O entrismo tem outras condições e sobretudo é feito em partidos operários. (Refere-se a uma ideia que levantou o painelista de IZAR, de que a esquerda revolucionária no Estado espanhol deveria ter entrado toda no Podemos em seu início, veja aqui o debate em video)

Se queremos buscar uma definição para o Podemos, eu pessoalmente o definiria como um fenômeno populista de esquerda, adaptado, e que gira sempre mais a direita.

Os marxistas revolucionários, desde seus primeiros passos, não se encontram deslocados, claramente porque têm um método que outros não tem. E porque temos que limpar o joio para enfrentar estes fenômenos. Denunciá-los, reivindicar nossa independência política, opor uma consciência política de classe e uma política revolucionária.

Relançar o movimento operário seguindo o exemplo francês, e utilizar a tática de frente única (no Estado espanhol poderia se pensar em chamar a Esquerda Unida para construir um movimento de luta operária e a romper com o Podemos).

Desenvolver um programa de reivindicações gerais transitórias, que nesta fase poderia se dar na repartição do trabalho existente mediante a diminuição das horas de trabalho, mantendo o mesmo salário; um salário mínimo aos desempregados que buscam trabalho; a abolição das leis de trabalho temporário; a nacionalização, sem indenização e sob controle operário das empresas que demitem; o não pagamento da dívida pública; a nacionalização dos bancos e a criação de um único instituto estatal de ponta a serviço dos trabalhadores e da população; a exprorpriação dos bens da Igreja que não estão destinados ao culto; permitir o direito democrático de autodeterminação dos povos; reivindicar o fim da monarquia e a instauração de uma república dos trabalhadores.

* Elder Rambaldi do PCL de Itália participou da Escola de Verão internacionalisra de Rede Esquerda Diário na Europa, no debate “Balanço do neorreformismo europeu e a estratégia da esquerda revolucionária e anticapitalista”.




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