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OPINIÃO | A lenda do general nacionalista

A demissão de Castelo Branco e a indicação de um influente general para a presidência da Petrobras encheram de esperança dirigentes sindicais e petistas. A grande gritaria da imprensa a serviço do mercado financeiro colaborou para a percepção de que mudanças mais profundas podem estar em curso.

Thiago FlaméSão Paulo

quarta-feira 24 de fevereiro de 2021 | Edição do dia

Até o golpe de 1964 se acreditava na existência de um setor nacionalista no generalato e no Alto Comando do exército. Os generais nacionalistas eram vistos como a garantia de que o governo de João Goulart seguiria até o final do seu mandato. No entanto, todos os nacionalistas preferiram se ajoelhar perante os amos do norte do que se juntarem a um povo rebelde.

Mais ainda, que nacionalismo é esse que debutou na guerra do Paraguai onde Brasil e Argentina combateram a serviço dos interesses do Império Inglês? Educados pelos instrutores alemães e depois pela missão francesa, o auge do nacionalismo dos nossos generais se deu no final da década de 30, onde o máximo que fizeram foi buscar se alinhar com o lado vencedor na II Guerra e dele obter alguns benefícios. As simpatias do generalato estavam com o Eixo, com o fascismo e o nazismo, mas o ouro Ianque falou mais alto.

Ainda na década de 1950 o generalato barrou a tentativa de golpe para impedir a posse de JK e deu apoio ao seu programa de governo, que passava pela abertura e expansão sem limites das multinacionais de veículos e investimento nas industrias que os capitais multinacionais não tinham interesse (de certa forma a política econômica da ditadura, sobretudo a partir de Geisel, seguiu o mesmo caminho com algumas modificações). A construção de Brasília foi a festa das empreiteiras e cumpriu o objetivo de afastar o povo do centro do poder estatal. Aliás, para não cometer injustiças, digamos que sim, sempre existiram generais profundamente nacionalistas no exército brasileiro, profundamente preocupados sobretudo com a unidade da federação. Esses generais sabem que a defesa da pátria no Brasil, a pátria escravagista e subalterna, se dá fundamentalmente contra os "inimigos internos". Nunca se furtaram de pedir ajuda e se ajoelhar perante as potencias estrangeiras, em nome da defesa da pátria, da sua pátria. Da "Missão francesa" para a "Escola das Américas" em atividade até hoje, pouco mudou.

Não ficamos chocados nem surpresos, mas indignados, vendo a FUP, a CUT e a direção do PT avaliando o novo presidente da Petrobras. Diz a FUP que “com a queda de Roberto Castello Branco, a FUP e seus sindicatos esperam que a Petrobrás retome seu protagonismo na economia brasileira”. Um pouco mais cauteloso, um Aloisio Mercadante, presidente da Fundação Perseu Abramo, escrevendo em nome da diretoria executiva da Fundação Perseu Abramo, afirma: “a troca de cadeiras teve como estopim mais uma elevação no preço dos combustíveis. Mas a alteração na Presidência da empresa não terá nenhuma serventia se não vier acompanhada de uma mudança na atual política de preços da Petrobras e no reposicionamento da empresa como protagonista do desenvolvimento econômico, industrial e tecnológico brasileiro.”

Vergonhosa trégua que oferecem ao general. Esperamos que os petroleiros de todos o país corrijam sua Federação, sigam suas medidas de forças e não deem nenhum minuto de respiro ao novo presidente da Petrobrás, que vai ter uma serventia muito distinta daquela que a FUP e a Fundação Perseu Abramo aguardam com expectativa. A gritaria do mercado financeiro deve ser entendida não como um rechaço ao novo presidente, mas como forma de deixar bem claro (para o governo, mas também para caminhoneiros e a base social do governo) os limites de onde ele opera – o próprio general já afirmou que não vai mudar sequer a política de preços.

Bolsonaro precisa conciliar dois polos de interesses cada vez mais enfrentados para assegurar sua reeleição. No caso da Petrobrás ia se equilibrando entre o avanço das privatizações e uma política de preços absolutamente antipopular, e a necessidade de manter o apoio e conter o movimento de caminhoneiros. Castelo Branco pisou na bola por que ofendeu os caminhoneiros. Bolsonaro – vejam também os discursos do general Heleno – agiu rapidamente impondo a troca e demonstrando alguma força frente a Guedes. A coisa toda talvez não vá muito além disso.

Basta ver a redação da MP emergencial, que acabaria com o piso de investimento em saúde e educação, para perceber que podem até existir diferenças entre Guedes e os generais do governo, mas que a unidade contra a classe trabalhadora e a juventude estão acima dessas diferenças.

Não esperamos nada do general Silva e Luna além de atender aos interesses do capital financeiro e explorar alguma margem que lhe deem para medidas parciais que aplaquem o ódio dos caminhoneiros e outros setores com o aumento do combustível, ou ao menos permita Bolsonaro dizer que tentou. É somente com a organização e a mobilização do movimento de massas que mudanças favoráveis ao povo poderão ser arrancadas desse governo entreguista.




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