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A face do racismo frente ao arquivamento do caso do menino Eduardo de Jesus morto no Alemão

"Há uma morte negra que não tem causa em doenças; decorre de infortúnio. É uma morte insensata, que bule com as coisas da vida, como a gravidez e o parto. É uma morte insana, que aliena a existência em transtornos mentais. É uma morte de vítima, em agressões de doenças infecciosas ou de violência de causas externas. É uma morte que não é morte, é mal definida. A morte negra não é um fim de vida, é uma vida desfeita, é uma Átropos ensandecida que corta o fio da vida sem que Cloto o teça ou que Láquesis o meça. A morte negra é uma morte desgraçada." (Batista; Escuder; Pereira, 2004, p.635)

quarta-feira 30 de novembro de 2016 | Edição do dia

A morte do menino Eduardo de Jesus, no conjunto de favelas do alemão, foi um dos lamentáveis fatos que marcaram a nossa história em abril de 2015. Na época a então presidente Dilma Rousseff se pronunciou em nota dizendo que "Espero que as circunstâncias dessa morte sejam esclarecidas e os responsáveis, julgados e punidos.". Pois bem, uma parte da situação foi esclarecida, 7 meses depois foi comprovada que o disparo que matou o menino partiu do fuzil de um dos policiais que faziam operação na favela do Areal, uma das favelas do Alemão, contudo a polícia civil insistiu em dizer que foi em legitima defesa.

No laudo da época, o disparo foi dado a uma distancia de cerca de 5 metros, contra um menino que jogava no celular em frente de casa a luz do dia. A família e vizinhos no ocorrido se mobilizaram para que não houvesse nenhuma mudança no corpo do menino ou a implantação de alguma arma, e afirmaram que não houve nenhum tiroteio no dia que pudesse justificar a ação do policial, mas a divisão de homicídios da polícia civil do Rio de Janeiro ignorou este fato e insistiram na tese da coordenadoria de policia pacificadora, que dizia que "houve confronto e o menor foi baleado", assim, o tiro atingiu "acidentalmente" o menino, e por isso a ação foi em legitima defesa. Em meio a essa situação o Ministério Público ofereceu denuncia contra os policiais envolvidos pra que eles fossem julgados. E o julgamento que foi nesta terça (29/11) deu que, dois, dos três desembargadores da segunda Câmara criminal do RJ decidiu pelo arquivamento do caso, alegando "falta de provas".

A narrativa comum de que sempre haverá falta de provas para a morte de um corpo negro, até mesmo se for uma criança, é resultado claro do fruto da estrutura racista que é o judiciário, ora, a ação violenta e fascista da policia militar encontra respaldo e legitimidade no discurso da policia civil, que encontra legitimidade no discurso da procuradoria, que por sua vez encontra legitimidade no discurso do judiciário. Se não fosse a divisão de suas tarefas e funções você não saberia de quem é a fala, nesse jogo onde uns nos matam com a bala do fuzil, outros nos matam com a caneta do arquivamento da investigação. É importante destacar esse entendimento de que a polícia não mata sozinho, é inclusive fundamental para entender esse atual situação, junto com ela também está o judiciário, que se entrelaçam junto com a polícia na formação do braço opressor do Estado, sua finalidade é de origem escravocrata e continua muito clara: garantir a todo custo atual ordem vigente.

Uma pesquisa feita pelo núcleo de Estudos da Cidadania, Conflito e Violência Urbana da UFRJ em 2013, geradora do livro Quando a política mata: homicídios por auto de resistência" no Rio de Janeiro conclui que "o número de inquéritos de autos de resistência arquivados face à exclusão de ilicitude, a partir de 2005, alcança a cifra de 99,2% dos inquéritos instaurados" ocorrendo esses arquivamentos em menos de 3 anos. Ou seja, vemos aqui a legitimidade comprovada de execuções sumárias através do arquivamento desses inquéritos policiais.

A identificação da figura da vítima, como o inimigo ou então criminoso, encarnada na categoria fantasmática do negro traficante de drogas (o mal a ser combatido), é uma tentativa clara de justificar e legitimar o genocídio do povo negro. A luta para exigir que o Supremo Tribunal de Justiça em Brasília recorra desse caso é essencial para mostrarmos que luta por justiça pela morte do menino Eduardo de Jesus, é uma luta de todos aqueles que almejam desmontar essa aparato repressivo que joga a vida do povo negro as berlindas da sua gaveta do esquecimento.

#ChegaDeChacinaNasFavelas

Complementos
campanha da Anistia Internacional sobre o caso do Eduardo de Jesus: https://anistia.org.br/entre-em-acao/email/acao-urgente-justica-para-eduardo/

Referencias
VERANI, Sérgio. Assassinos em nome da lei. Rio de Janeiro: Aldebarã, 1996
ZACONNE, Orlando. Indignos de vida: a forma juridica da politica de exterminio de inimigos na cidade do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Revan, 2015
Site da Anistia Internacional: https://anistia.org.br/entre-em-acao/email/acao-urgente-justica-para-eduardo/
Site da Justiça Global: http://www.global.org.br/blog/nota_jg_caso_eduardo/
Página do Fórum de Juventudes do RJ: https://www.facebook.com/forumdejuventuderj/?fref=nf




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