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LATINOAMERICA | A Argentina no espelho do Brasil: consequências de votar no “mal menor”

Daniel MatosSão Paulo | @DanielMatos1917

sexta-feira 30 de outubro de 2015 | 00:00

Fotografia: lanoticiabonaerense

A presidenta Dilma Rousseff ganhou dizendo que seu oponente direitista era um neoliberal que ia atacar os direitos dos trabalhadores. O próprio Aécio Neves (uma espécie de “Macri brasileiro”) fez tanta demagogia quanto pôde para esconder seus planos de ajustes contra os trabalhadores. Terminado o “show” do cinismo eleitoral, o governo do Partido dos Trabalhadores (PT) de Dilma e Lula da Silva, passou a implementar os ataques com o apoio da oposição de direita no Congresso e nos estados que governa.

Segundo dados do próprio governo, desde as eleições até julho de 2015, o número total de desempregados subiu de 6,5 milhões a 8,6 milhões, 2 milhões de pessoas a mais na rua. Milhares de trabalhadores foram suspensos com redução salarial. O salário real caiu 4,3% pela desvalorização da moeda. Houve cortes orçamentários de 15,3% na educação, 11,4% na saúde, 32,1% nos transportes e 54,3% em moradia. O governo já se comprometeu com mais cortes para 2016, com o adiamento do aumento de salários para os funcionários públicos e também foi aprovado no Congresso o ataque ao direito à assistência estatal frente ao desemprego ou a doenças ocupacionais.

Esta mentira eleitoral, combinada com os escândalos de corrupção na Petrobrás, fez com que a popularidade de Dilma despencasse a índices inferiores a 10%. A oposição de direita ameaça Dilma com um julgamento político por mal uso dos recursos públicos. Mas seu objetivo, como eles mesmos dizem, é “sangrar mas não matar”, pois a burguesia está contente com a implementação dos ajustes e com o desgaste do capital político de Lula para as eleições futuras.

Os trabalhadores enfrentam os ajustes

Foram várias as lutas de resistência contra as demissões e ajustes. Metalúrgicos, professores, carteiros, trabalhadores não docentes das universidades, bancários, estudantes secundaristas, etc. São expressões que ainda persistem das grandes manifestações de junho de 2013. A burocracia sindical governista trata de manter estas lutas isoladas e contidas, impedindo que se transformem em palanques para a construção de um grande movimento nacional de luta contra os ajustes.

Para responder à insatisfação, o PT teve que chamar dias de mobilização nacional por meio da CUT. Da mesma forma que estas jornadas expressam uma importante disposição de luta, demonstram também o esforço das direções sindicais petistas para preservar “seu” governo. Não só se negam a mobilizar seus principais bastiões operários com um plano de continuidade e aprofundamento da luta, senão que condicionam as ações para que sejam inofensivas.

Cinicamente, os petistas mostram Lula e Dilma como pobres vítimas, escolhendo como alvo de sua “luta” o Ministro da Fazenda, e o fortalecimento de uma “direita” pela qual o PT supostamente não teria nenhuma responsabilidade. Os árduos defensores petistas do voto útil como mal menor de ontem são os mesmos que ao longo de todo o ano impediram que o desenvolvimento da luta contra os ajustes colocasse o governo em xeque. O discurso do mal menor serve para esconder que Dilma tomou a agenda da direita. Ou seja, o perigo do “mal maior” da direita reacionária sempre serve como desculpa para nunca por de pé uma força social e política dos trabalhadores que combata os ajustes levados a cabo tanto pelos “males menores” como pelos “males maiores”. E assim, de mal menor em mal menor, os ataques do PT de Lula e Dilma vão passando e a direita vai se fortalecendo.
Troca de experiências entre Argentina e Brasil

Nas eleições de 2014 no Brasil não existiu uma esquerda com grande visibilidade nacional que utilizasse a campanha para defender claramente a necessidade de preparar-se para os ajustes que viriam, fortalecendo as lutas dos trabalhadores e da juventude, como existiu nas recentes eleições na Argentina com a Frente de Esquerda e dos Trabalhadores (FIT) e a candidatura de Nicolás Del Caño. Pelo contrário, o partido mais conhecido da esquerda, chamado Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), apesar de ter sido a quarta força mais votada, alimentou a ilusão de que pela via das eleições seria possível responder aos interesses dos trabalhadores e do povo pobre.

A experiência brasileira deveria servir para mostrar aos trabalhadores e à juventude da Argentina que o apoio ao “mal menor” vai contra a necessária preparação para lutar. Em 2014 o PSOL deu “liberdade de ação” no segundo turno e seus deputados terminaram integrando a campanha pelo voto útil em Dilma. A campanha que Nicolás del Caño está impulsionando agora defendendo o voto em branco ou nulo como forma de preparar a luta contra os ajustes que virão pelas mãos de quem ganhar, é um exemplo para toda a esquerda latino-americana de como organizar uma força social e política dos trabalhadores em combate contra os distintos setores da burguesia e seus representantes políticos. Quanto maior for o apoio a esta campanha, mais fortes estarão os trabalhadores para lutar e mais fracos estarão os ajustadores.

Faz falta uma esquerda de combate no Brasil

Hoje o PSOL integra a “Frente Povo Sem Medo” junto com o PT (representado pela CUT e a UNE), diluindo o combate contra os ataques de Lula e Dilma no difuso discurso “contra a direita”, e ajudando a lavar a cara da burocracia sindical governista “pela esquerda”.

A outra organização da esquerda brasileira, o Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado (PSTU), apesar de não ter projeção eleitoral, dirige a central sindical opositora minoritária chamada CSP-Conlutas. O PSTU não integrou a “Frente Povo Sem Medo” e denuncia o papel de Dilma nos ataques. No entanto, ao defender a derrubada de Dilma sem que haja um movimento dos trabalhadores que possa superá-la pela esquerda, termina cumprindo um papel auxiliar ao discurso de impeachment da direita.

Esta localização da esquerda como linha auxiliar do PT ou da direita, faz com que seu discurso de “terceira força” esteja separado das necessidades da luta de classes e voltado a objetivos eleitorais ou de construção sectária. Nestes marcos, as marchas, atos e encontros organizados por esta esquerda não servem para disputar as bases dos grandes sindicatos dirigidos pela burocracia sindical governista ou opositora.

O Movimento Revolucionário de Trabalhadores – organização-irmã do PTS no Brasil – luta por uma esquerda que ponha todas suas forças à serviço das lutas dos trabalhadores e da juventude, transformando-as em palanques para reviver as forças de junho de 2013, superar os obstáculos impostos pela burocracia sindical e por de pé um grande movimento nacional verdadeiramente capaz de acabar com os ajustes do governo. Essa é a batalha que damos dentro da CSP-Conlutas e em cada lugar de estudo ou trabalho em que atuamos.




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