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MARIELLE FRANCO | 805 dias sem justiça! Não à federalização do caso de Marielle e Anderson. Por uma investigação independente!

805 dias sem justiça. Quem mandou matar Marielle Franco? Esse crime que chocou o mundo inteiro e marcou o país segue impune e agora ecoa no centro da principal crise política desde o início do governo Bolsonaro.

Carolina CacauProfessora da Rede Estadual no RJ e do Nossa Classe

quarta-feira 27 de maio de 2020 | Edição do dia

Hoje o Superior Tribunal de Justiça julga o pedido de federalização do caso (Incidente de Deslocamento de Competência), feito pela ex-procuradora-geral da República Raquel Dodge, um dia antes de sair do cargo em setembro do ano passado. A então procuradora-geral alegou que havia “inércia” na investigação dos homicídios da vereadora Marielle Franco e Anderson Gomes por parte da Polícia Civil e do Ministério Público do Rio (MP RJ). Caso seja votada a mudança, a apuração do crime passaria a ser feita pela Polícia Federal, o Ministério Público Federal (MPF) e a Justiça Federal.

Longe de significar um avanço na resolução desse crime bárbaro, o julgamento ocorre no momento em que se aprofunda a disputa entre os militares do governo Bolsonaro e o judiciário, sobretudo na figura do STF. Moro após sua saída do governo, denunciou que Bolsonaro estava querendo intervir diretamente na Polícia Federal do Rio de Janeiro. No vídeo da reunião Ministerial, marcada por declarações racistas e autoritárias, não apenas se fala da interferência de Bolsonaro na PF RJ, como também Bolsonaro afirma querer defender os interesses de defender a família e amigos do presidente.

Não é surpresa pra ninguém as relações diretas da família Bolsonaro com o submundo criminoso carioca, sobretudo com as milícias do Rio. Flávio Bolsonaro, está sendo investigado por suspeita de peculato, lavagem de dinheiro e organização criminosa. Entre as denúncias está o esquema de rachadinha feito com Fabrício Queiroz, seu ex-assessor. Na Alerj, empregou a mulher e a mãe do Adriano da Nóbrega, peça chave na investigação do assassinato de Marielle Franco e foi assassinado recentemente pela polícia (possivelmente uma queima de arquivo), era um dos chefe milícia, vinculada ao Escritório do Crime, a mesma a qual fazem parte os acusados de assassinato de Marielle e Anderson, Ronnie Lessa e Élcio Vieira. Ronnie Lessa morava no mesmo condomínio de Bolsonaro e o episódio da denúncia do porteiro é mais um elemento mal explicado até hoje.

É obvio que com as tentativas de Bolsonaro de controlar a PF do Rio de Janeiro, a federalização do caso pode significar um controle e interferência ainda maior para impedir que seja descoberto os mandantes desse crime brutal. Marielle foi assassinada durante a intervenção federal no Rio de Janeiro dirigida pelo Gal Braga Neto, hoje à frente do gabinete de crise e ministro da Casa Civil, enquanto denunciava a violência de negros e negras pela mão da polícia. O Ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional, General Augusto Heleno, chefiou a intervenção brasileira no Haiti, a mando do governo Lula, um laboratório para a implementação das UPP’s e de mais violência nas favelas do Rio. O peso dos militares nesse governo, representa também a impunidade dos crimes cometidos na ditadura que permanecem hoje nas práticas de genocídio dos negros e negras e na falta de resposta desse crime.

Bolsonaro e seus filhos não disfarçam o ódio e desprezo por Marielle. Encheu sua boca suja pra ousar se comparar a Marielle, após a saída de Moro. Marielle incomoda Bolsonaro não apenas por ter disso mulher negra, lésbica e de esquerda, uma lutadora que denunciava a violência policial e o racismo que ele tanto incentiva. Marielle incomoda porque ela é a ferida aberta que escancara a impunidade de um escandaloso crime político de responsabilidade do estado. O assassinato de Marielle é a ferida que pode expor ainda mais a podridão dessa família e resultado de uma nova correlação de forças aberta depois do golpe institucional que veio para massacrar ainda mais o povo pobre e os trabalhadores.

As famílias de Marielle e Anderson são contra a federalização do caso, e vem batalhando contra isso. O Instituto Marielle Franco, dirigida pela família de Marielle, as companheiras de Marielle e Anderson, Monica Benicio e Agatha Reis, e a Coalizão Negra por Direitos, com mais de 150 organizações do movimento negro, com o apoio de dezenas de organizações da sociedade civil lançaram uma mobilização contra a federalização. Por isso nos solidarizamos com as famílias e acompanhamos essa decisão e nos somamos a todos que lutam contra a interferência de Bolsonaro nesse caso.

No entanto, ao longo desses dois anos de uma longa espera por respostas, o caso investigado pela Polícia Civil do Rio de Janeiro e pelo MP-RJ já rodou por diversas versões, todas elas controversas. Por meses a própria investigação admitiu que vinha seguindo pistas falsas. Os poderes do Rio também tentam manter o controle do caso, para ser usado na disputa com Bolsonaro. Witzel, está sendo alvos de operações por escândalos de corrupção, numa escalada no choque contra Bolsonaro em meio a pandemia. No meio da crise política e sanitária o caso tem um enorme peso para o uso político por parte de quem quer controlá-lo. Com todos os recursos que podem ser usados numa investigação, tudo indica que essa verdade já existe, só não é pública.

Não podemos ter nenhuma confiança que a Polícia Federal, que cada dia mais demonstra os usos políticos desta instituição queira resolver o crime. O judiciário, essa instituição reacionária que tentar se colocar como árbitro no país é responsável pelo encarceramento em massas dos negros e negras, nunca estiveram do nosso lado e casos como de Rafael Braga e Renan da Penha deixam claro o racismo presente nessa instituição. Por isso, não podemos ter nenhuma confiança nessas alas para resolver esse crime. Esse mesmo Judiciário racista assegura a impunidade do exército e das polícias que assassinam nas favelas o que abre espaço para o absurdo que foi a operação policial que abriu fogo contra moradores que distribuíam cestas básicas na Cidade de Deus e no caso do músico Evaldo Souza, por exemplo, onde todos os militares que disparam 80 tiros contra o carro em que ele estava com sua família foram absolvidos.

O pacote anti-crime do Moro é outro ponto de apoio que as polícias e o exército encontram no judiciário para seguir matando nas favelas, o partido dos Panteras Negras deram um exemplo bastante importante a qual podemos nos apoiar para não ter nenhum confiança nesse judiciário racistas, sobretudo na investigação do crime contra Marielle. Um de seus pontos de programa levantava que os negros que fossem acusados de qualquer crime deveriam ser julgados na corte por um júri composto por seus pares ou por pessoas das comunidades negras. Não podemos ter confiança no judiciário racistas e por isso é necessário defender uma investigação independente.

Nós desde do início colocamos que para arrancar as verdadeiras respostas do brutal assassinato da Marielle, era preciso exigindo que o Estado descubra os culpados, junto investigação independente com representantes do mandato do PSOL, com figuras do direito humanos, de movimentos de favelas e sindicatos de movimentos de favelas, organismos de direitos humanos, peritos especialistas comprometidos com a causa. Com recursos garantidos pelo Estado com todas as condições para que uma investigação independente possa trabalhar, disponibilizando materiais, arquivos e todas as condições materiais, financeiras, e físicas para a realização plena e ampla da investigação, com acesso a todos os autos do processo para acompanhar e poder seguir todos os passos que a polícia dá, e também dar passos próprios que efetivamente dêem solução para o caso e que se ache os culpados.

Nesse momento de pandemia ainda não podemos ir às ruas para impor essa saída com uma ampla mobilização, mas os governos e judiciário da enorme mobilização social que tomou o país e mundo na luta por Justiça para Marielle e Anderson.

O assassinato de Marielle, um crime político, racista e extremamente covarde ainda sem solução representa de maneira bastante cruel o que o capitalismo tem a oferecer aos negros. Foram milhares de jovens e trabalhadores que depositaram sua confiança através do voto em mulher negra que levantava a bandeira da luta das mulheres e pautas antiracistas que sentiram como a dor de quando morre alguém tão próximo, que estão com o grito entalado de “Quem mandou matar Marielle?” Negros e negras que sofrem diariamente com a opressão do racismo no trabalho, em seus bairros e no medo da violência policial. Milhares de jovens que hoje se vêem de um jeito que seus pais nunca viram, tendo orgulho de sua cor, cabelo, cultura, etc. e a cada dia que passa sentem a necessidade de construir uma sociedade sem racismo que na pandemia estão trabalhando nos aplicativos de entrega de comida para não morrerem de fome.

São quase 25 mil mortos pela pandemia no Brasil, sendo a maioria de negros. Somos a maioria entre os setores mais atingidos pelo desemprego e a fome, entre os trabalhadores que estão na linha de frente trabalhando e arriscando suas vidas. Como se não bastasse as condições estruturais de miséria e exploração que o racismo estrutural aprofunda na crise sanitária, a COVID mostra que eles sabem nos matar de todas as formas. No meio da pandemia chacinas, operações policiais de março a maio mataram 69 pessoas que estavam em casa.

Hoje nosso grito ecoa por justiça a João Pedro, João Victor, Juan, Rodrigo, Iago, as 13 pessoas mortas no Complexo do Alemão e se soma a revolta que toma as ruas nos EUA contra a polícia e política racista de Trump que matou brutalmente Ahmaud Arberry, Breonna Taylor e de forma sádica George Floyd, sufocado até a morte pela polícia. A realidade chama os negros a assumirem seu lugar de destaque na luta de classes como fizeram historicamente. Que nos organizemos para dar uma saída de fundo para todos esses problemas sociais, sanitários, políticos e econômicos que assolam a classe trabalhadora e o povo pobre, com uma constituinte livre e soberana para que tomemos os rumos do país nas nossas mãos, para dar um basta na repressão policial e arrancar justiça a Marielle e Anderson e todas as vítimas da violência do estado.




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