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DIREITO AO ABORTO | 8 de Agosto: parar Natal em defesa do aborto legal, seguro e gratuito

Marie CastañedaEstudante de Ciências Sociais na UFRN

terça-feira 24 de julho de 2018 | Edição do dia

Uma maré verde inundou a Argentina, forçando o Congresso a aprovar a legalização do aborto. No dia 08 de Agosto, a votação irá ao Senado, e as mulheres argentinas, que preencheram as ruas com milhões para obrigar a casta política conservadora a aprovar a lei, estão fazendo de tudo para garantir uma mobilização ainda maior que arranque este direito elementar de sobrevivência das mulheres. No Brasil, 64% da população opina que a interrupção da gravidez é escolha da mulher, mas seguimos sem este direito garantido e é urgente que o movimento decida batalhar definitivamente por ele.

As manifestações massivas são chamadas de “maré verde” pelos lenços verdes que se tornaram símbolo da luta pelo direito ao aborto, produzidos pela Campanha Nacional Pela Legalização do Aborto, hoje ocupam punhos, bolsas, cachecóis e até mesmo bengalas de senhoras por toda Argentina. Os vídeos da emoção ao resultado da votação viralizaram na internet, evidenciando onde isso foi conquistado: com luta nas ruas, unificando mulheres e homens, trabalhadoras e trabalhadores.

Esta luta não se construiu da noite para o dia, mas carrega consigo uma história de décadas. O projeto de lei votado foi apresentado em 2007 e já acumula três rechaços. Colocada novamente em pauta, as mulheres se mobilizaram e nos locais de trabalho e estudo pautaram a defesa da vida das mulheres. Organizaram, assim, debates extremamente amplos que possibilitaram o acesso de grande parte da população à discussão sobre a necessidade de impedir que as mulheres morram, também como a exigência de educação sexual integral e o acesso a contraceptivos garantidos pelo Estado. As mais de 6000 mulheres organizadas no Pan y Rosas cumprem um papel central na construção desta luta tanto desde as bases, quanto da bancada de parlamentares da FIT, Frente de Esquerda e dos Trabalhadores (a única bancada unificada nesta votação), encabeçada pelo Partido dos Trabalhadores Socialistas (PTS). O PTS, que batalha pela construção de alas socialistas e revolucionárias no movimento de mulheres através do Pão e Rosas - e que possui grande inserção no movimento operário argentino (chegando a organizar uma plenária de milhares de trabalhadores no interior da gráfica Madygraf para discutir a legalização do aborto) - é a organização irmã do MRT na Argentina.

No Brasil, assim como na Argentina, quem morre pela não legalização do aborto são as mulheres trabalhadoras, já que estas tem impedimentos financeiros para realizar o procedimento de forma segura. Por isso exigimos o direito ao aborto legal, seguro e gratuito e que seja garantido pelo Estado. Esta demanda é concreta e sentida pelas mulheres, já que mesmo os procedimentos contraceptivos não são 100% confiáveis e a ausência do direito à maternidade no capitalismo piora ainda mais a situação, sem a existência de amparo estatal necessário. Até mesmo entre religiosos, de acordo com o IBOPE, a concordância na decisão pela interrupção ser da mulher é a opinião de 65% dos católicos, 58% dos evangélicos, e 70% dos que possuem outras religiões, ou seja, o que é colocado como um tabu terminal pelas Igrejas Católica e Evangélica, parece ser um direito mínimo com o qual uma porcentagem surpreendente da população pode concordar.

O que Bolsonaro e outras figuras reacionárias e golpistas pregam quanto à educação sexual nas Escolas e para qual, combinado com buscar impedir qualquer pensamento crítico, desenvolveram o Projeto Escola Sem Partido, corresponde em realidade com a opinião de apenas 9% da população.

O que falta então para que todos joguem suas forças para trazer a maré verde para o Brasil?

Os anos sob os governos petistas não significaram um avanço no direito ao próprio corpo das mulheres. Enquanto o golpismo ataca as mulheres sem precedentes, inclusive permitindo o trabalho de gestantes em locais insalubres, foi o próprio PT que abriu espaço para estes setores em seus governos. Para garantir sua eleição, por meio da Carta ao Povo de Deus e o Pacto Brasil-Vaticano, o PT usou os direitos das mulheres como moeda de troca para acordos parlamentares com a direita, assim como o fez Cristina Kirchner na Argentina. Durante estes anos, a Marcha Mundial de Mulheres, CUT, CTB e UNE cumpriram um papel de frear a luta das mulheres, colocando que não era o momento de lutar pela legalização, sendo que não permitem a auto-organização de suas próprias bases. Hoje a MMM diz lutar pela legalização, uma completa mentira, já que não fazem a menor crítica ao PT e se “esquecem” de que o governo Dilma foi um entrave à conquista do direito ao aborto, governo em que milhares de mulheres morreram por abortos clandestinos.

No Brasil a descriminalização do aborto será pautada no STF nos dias 03 e 06 de agosto. A chamada Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 442 é de iniciativa do PSOL e da Anis - Instituto de Bioética, e será discutida em audiência pública sem poder de decisão. Ainda que a medida seja um avanço diante da criminalização, isso não tornaria o aborto um direito para as mulheres, seguro e gratuito, garantido pelo Estado. As mulheres trabalhadoras e negras seguiriam morrendo por abortos clandestinos. O PSOL, através da ADPF, não coloca em primeiro plano a legalização do aborto. O poderoso movimento de mulheres na Argentina mostra o caminho: devemos lutar para que o aborto seja um direito, não apenas que não seja crime. Além disso, tanto a confiança no STF (pilar do golpe institucional) enquanto o setor que fará avançar a legalização do aborto, quanto a lógica de construção que passa por fora de pensar a auto-organização em cada local de trabalho e estudo, mostram a adaptação do PSOL às instituições do Estado, e não a confiança na luta das ruas. Esta estratégia jurídico-parlamentar servirá exclusivamente para atender a interesses eleitorais, sem colocar em risco a estabilidade do regime ou sair da margem na qual obviamente se pode atuar.

No Rio de Janeiro, onde o PSOL tem peso superestrutural de massas e onde é a segunda bancada mais forte na Assembleia Legislativa é diretamente inexplicável porque seus parlamentares não encabeçam uma enorme batalha em defesa da legalização do aborto, principalmente frente aos enormes ataques de Marcelo Crivella.

Nós do grupo internacional, feminista e socialista Pão e Rosas batalhamos para que seja lei e para isso é preciso impor com luta. Entre um Congresso conservador e um STF golpista, o que se precisa é organizar a mobilização pelo nosso direito ao aborto. Façamos como as argentinas! A adaptação de programa que o PSOL está levando adiante, ao substituir em seu discurso e consignado a legalização do aborto pela descriminalização, ignora a grande experiência internacional argentina. Além disso, esta não será uma instância decisória e pode demorar até 10 anos para se transformar em lei que possa ser votada. E que cumpre um papel político reacionário no país, retirando direitos elementares da população.

Consideramos que a luta das mulheres trabalhadoras, trabalhadores e jovens argentinas e argentinos pode trazer muitíssimas lições e exemplos para a construção da luta pelo direito ao aborto, mas também para a construção de uma força que possa fazer frente aos ataques golpistas e do próximo governo que se eleger, que necessariamente aplicará mais ajustes. A principal delas é a confiança nas próprias forças, das mulheres que compõe a maior parte da classe trabalhadora e podem levar ao seu lado os homens, nas jovens que se revoltam contra miséria imposta, com os nossos próprios métodos. A madrugada que antecedeu o 1 dia e meio de discussão e votação definitiva no Congresso foi de ocupações de escolas e universidades e antecedido por meses de uma discussão profunda em todas as categorias possíveis, fazendo uso dos espaços institucionais, mas no chão de fábrica, nos prédios administrativos, convocando espaços de autoorganização e impulsionando atividades e materiais escritos.

A manifestação em solidariedade às mulheres argentinas no dia 08 de Agosto pode ser um passo inicial para construir a mobilização pela legalização do aborto no Brasil, apostando em forças que possam verdadeiramente arrancá-lo: as forças das ruas. Esta já foi aprovada em algumas capitais, como São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte. O Rio Grande do Norte foi palco da greve dos trabalhadores da saúde no ano passado e neste, assim como dos professores municipais e estaduais, categorias majoritariamente femininas que mostraram a cara de um Estado que já não suporta mais ataques.

As direções destas categorias, a CUT e a CSP-Conlutas tem obrigação de convocar e construir esta luta.

Por isso fazemos uma exigência ao DCE da UFRN e da UERN, dirigidos pelo PT e pelo qual impõe passividade, a ter responsabilidade frente à vida das mulheres e convocar espaços para que esta luta que construa desde às bases e aos Centros Acadêmicos, muitos destes dirigidos pelo PT, Juntos e Levante. Assim como ao mandato do vereador Sandro Pimentel. O PSOL Potiguar tem como candidato a governador do Estado um patrão, mostrando sua falência em defender os trabalhadores, mas tem obrigação de convocar esta luta massivamente.

Nesta quarta-feira, dia 25/07, acontecerá na UFRN a conferência “A luta pelo aborto na Argentina”, as 10h00. A atividade contará com a participação virtual de Guadalupe Oliverio, estudante da Universidade de Buenos Aires e do Centro Acadêmico de Humanidades e Tom Máscolo, militante trans e editor do IzquierdaDiario.




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